Enéas 22/09/2012
Patologias da Obeviedade
Patologias da Obviedade. Resumo rapidamente o livro, para q o capítulo não fique descontextualizado. O autor diz que a realidade pode ser interpretadas de 2 formas distintas - O Aparente e o Oculto, sendo q essas duas formas têm, cada uma delas, outras duas interpretações. São elas: O aparente do aparente; O oculto do aparente; O aparente do oculto e O oculto do oculto. Inicialmente a gente pensa que é complexo (pelo menos diante da minha ignorância mental o foi), mas é apenas inicialmente. hehehehhehehe, depois vira uma leitura bem legal, profunda e interessante.
Espero q gostem do capítulo.
Patologias da obviedade - Por Nilton Bonder, tirado do livro O segredo Judáico de Resolução de Problemas.
Se por um lado o universo do aparente do aparente é bastante funcional, por outro carece da sofisticação necessária para garantir sua sobrevivência. A competitividade desta dimensão é insuportável. Todos pensam igual, vão ao mesmo lugar, tentam as mesmas coisas, têm as mesmas grandes idéias etc., porque estão no reino do aparente do aparente. Toda a travessia desde o enunciado até a resolução de uma questão mais profunda passa pela prospecção nas distintas realidades do aparentes e ocultos.
Uma história em particular é fundadora da mística judaica e demonstra a relação profunda que existe entre outras dimensões e a do aparente do aparente – em particular, entre a literalidade e o oculto. Trata-se da história dos quatros sábios que adentraram o PARDES. PARDES, que literalmente quer dizer pomar, dá origem às palavras paradiso e paraíso. Mais que isto: PARDES é um termo composto pelas iniciais das quatro formas de interpretação que marcam o pensamento segundo a tradição judaica: “Pa”, sendo a inicial de p’shat (ordinário), representando a dimensão da literalidade; “R”, a inicial de remez (vestígio), compreendendo o nível alusivo e metonímico; “De”, da palavra derash (extraído), apontando para a instância da metáfora e do simbolismo; e “S”, de sod (secreto), compondo o território do mítico e místico.
Conta esta lenda que os quatro sábios penetraram no “pomar” de interpretações e que como resultado desta aventura um deles conseguiu sair ileso, um morreu, outro enlouqueceu e o último tornou-se um herege.
Se pensarmos nesta incursão no pomar como uma figura do próprio ato de pensar, talvez possamos fazer algumas analogias interessantes. Primeiramente, aquela que consegue sair ileso representa alguém que pode passar pelos mundos do oculto do aparente, do aparente do oculto e do “oculto do oculto”com a segurança de que emergirá novamente na estrutura do aparente do aparente sem perda de sua funcionalidade. Tal individuo consegue, portanto, colher frutos deste pomar tão denso e envolvente, resgatando-os para uma dimensão onde podem ser usufruídos. O óbvio pode ainda ser resgatado, como terra firme em meio a toda a instabilidade e fluidez destes outros mundos.
Já o caso do individuo que perde a sua vida estaria representando a profunda desconexão experimentada entre o objeto de inquisição, a pergunta original e as respostas obtidas. Neste caso, haveria uma ruptura irreversível entre a lógica do problema original e a geração de sabedoria, resultando numa desintegração absoluta da dimensão do aparente do aparente. Não restaria, portanto, nenhuma forma de comunicar respostas dentro desta realidade, extinguido-se qualquer possibilidade de retorno – nada poderia ser apreendido deste passeio. Para este tipo de experiência , PARDES não produz nem conduz a qualquer melhoria na condição do saber. Representaria o oposto de sair-se ileso – sendo que por “ileso” representa-se um estado de possível ampliação do saber, seja por conhecimento ou por uma maior consciência de desconhecimentos. Se quiséssemos estabelecer uma relação com patologias possíveis, diríamos que a incursão resultando em “morte” representa uma exposição a dosagens excessivas da dimensão de sod (secreto), onde o “oculto do oculto” impossibilita qualquer contribuição na tentativa de responder. O escuro invade o espaço da claridade óbvia.
A incursão, por sua vez, que resulta em “loucura” expressaria o exagero ou a ênfase desmedida colocada na dimensão de derash (metafórico/simbólico), estabelecendo uma relação desvirtuada com o aparente do aparente por conta deste excesso. Neste caso, as respostas geradas a partir da visita ao pomar podem até mesmo tangenciar a questão original, mas não conseguem concretizar-se em termos práticos. Tais respostas permanecem constantemente no nível onde predomina o oculto do aparente, como estudaremos adiante. Elas produzem, portanto, absurdos que se transformam em obstáculos intransponíveis à praticidade e funcionalidade de uma resposta. Esta dimensão de “louco” mantém uma relação truncada com o aparente do aparente. Traz frutos do pomar que não são comestíveis, ou respostas que não respondem.
Já a incursão que gera como resultado o herege indica uma patologia típica de uma intoxicação com a dimensão de remez (alusiva/metonímica). Neste caso, exerce uma sedução traiçoeira à instância do aparente do oculto. Como veremos adiante, esta funciona de forma a relacionar inapropriadamente segmentos de dúvida e resposta. O aspecto aparente do aparente do oculto passa a ser compreendido como redutível à dimensão do aparente do aparente, passando-se por uma resposta. As alusões derivadas de seu processo de pensar (passear pelo pomar) tomam o lugar do objeto de pesquisa inicial e a resposta gerada pode até ser uma resposta, mas para outra pergunta. O herege, portanto, consegue uma resposta, diferentemente do louco ou do morto, mas não consegue convencer-se de que a está atrelando a uma pergunta equivocada. Acreditar que uma resposta é legítima para uma pergunta específica, quanto esta não o é, traz inúmeras complicações ao processo de pensar. O herege traz frutos comestíveis, mas eles estão podres. Ele não soube converter a composição molecular destes frutos do pomar para a realidade objetiva, e os traz mesmo em sua forma mutante.
As patologias que emergem na realidade do aparente do aparente e que tão comumente interferem nas eficácias, dizem respeito a teorias não aplicáveis (morto), a desvios permanentes da objetividade (louco) e a equívocos internalizados (herege).
Os mundos com os quais interagem no PARDES são de extrema periculosidade porque o domínio de um deles representa a impossibilidade de colher frutos. É importante salientar que também o mundo do aparente do aparente oferece o mesmo tipo de riscos que os demais. O prisioneiro do óbvio, o simplório, com certeza acaba experimentando um pouco de todas as demais patologias: morte, loucura e heresia. Isto porque não compreende de verdade a realidade e impõe uma luz que cega ao invés de iluminar.
É importante conceber que o pensamento, que a visita um PARDES, com a seriedade e o compromisso de encontrar uma resposta, é de ordem interativa. As respostas não estão em nenhum dos mundos de aparentes e ocultos, mas na transitividade que estes instauram. Ou seja, as incursões pelo pomar resgatam os frutos-respostas mais adequados a uma dada questão num dado momento.