Malu 17/02/2010
O romance é dividido em três partes: Ester, Riacho Doce e Nô
- Ester: A infância da protagonista Edna/Eduarda, com 10 anos, onde vive com um casal de irmãos e seus pais e avó paterna, num vilarejo rural da Suécia. Edna é a caçula dos irmãos, tem a função na casa de cuidar dos porcos. Sua vida muda com a chegada da doce e meiga professora Ester, que substitui a anterior, rigorosa com todos. Ester se apega à pequena Edna, e lhe dá aulas extra-classe de música e piano. Edna nutre um sentimento único e possessivo por Ester, denotando traços homoeróticos, bem evidenciados quando do encontro de Ester com um músico num concerto deste. Edna desenvolve uma dependência emocional por Ester a ponto de tentar o suicídio, o qual leva cinco anos para se recuperar completamente. E na tentativa de se afastar da vida e família humildes, casa-se com o engenheiro Carlos, um menino do mesmo local mas criado fora, mesmo sem amá-lo. Carlos é contratado para explorar petróleo numa pacata região do nordeste brasileiro e o casal viaja para o Brasil.
- Riacho Doce: O casal de suecos aporta em Riacho Doce, pequena vila de pescadores de Maceió, e Edna se encanta com o local, e busca interagir com os moradores e cultura locais. O tempo vai passando e o casamento oportunista começa a se esfacelar e Edna passa a trocar a companhia do marido por longas caminhadas na areia e banhos infindáveis no mar. Num dos eventos locais, Edna conhece o mestiço Nô, morador local mas embarcadiço em navio cargueiro, em passagem por Riacho Doce, neto da grande matriarca da vila, a velha Aninha, mistura de benzedeira, curandeira e bruxa.
- Nô: Edna se encanta com o mulato e se entrega à paixão avassaladora. Nô também se sente envolvido com a “galega”, mas sua avó usa de seus poderes místicos-religiosos para afastar o casal, pois Aninha considera Edna arma do diabo para seduzir o neto favorito. O rapaz, assustado com as palavras proferidas pela avó, que o amaldiçoa por se unir ao demônio louro, se afasta de Edna.
O autor nesta obra não só denuncia o preconceito sócio-racial, a exploração da barata mão de obra nordestina pelos estrangeiros e à modernização desenfreada e destruidora de uma cultura, mas nos brinda com outras incursões:
- A força da mulher na trama é definida pelas matriarcas Elba e Aninha, avós paternas de Edna e Nô, respectivamente. Ambas centralizadoras, temidas, detentoras do poder no clã. As noras são subservientes e silenciosas, sofridas e agastadas pela dura vida que levam. Os homens, à exceção de Nô antes do “ataque” na praia após romper com Edna, são submissos às mães, inexpressivos e fracassados.
- A religião e preconceito a esta é bem delineada nos três momentos do livro: a família de Edna é Protestante, a de Carlos, Católica e Ester, Judaica. Na Suécia, a família de Edna é “cuidada” por um pastor severo, e no lado brasileiro, a religião é liderada e conduzida pela velha e intimidadora Aninha, uma junção do catolicismo fervoroso com a feitiçaria e curandeirismo mesclados com um fanatismo ignorante e patético dos moradores locais.
- Tanto a família de Carlos como a de Edna são contrárias ao casamento dos filhos por questões evidentemente religiosas. A expulsão de Ester da escola por suposta interferência negativa para Edna e as crianças do local mascara, na verdade, a ascendência judaica da jovem professora.
E o que mais impressiona em todo o romance, é a figura de um Deus sempre punitivo, enraivecido,que só faz castigar e atemorizar, remetendo à desgraça os seus fiéis seguidores!
E o riacho, que dá nome ao local, carrega o infortúnio, doença e morte em seu leito, desaguando num mar fértil, salvador e provedor das famílias que dele tiram sua sub-vivência.