Coruja 08/08/2017Descobri esse livro ouvindo o Xadrez Verbal, podcast especializado em política internacional. Não me lembro o exato contexto em que Keret foi indicado - provavelmente em alguma conversa sobre o conflito Israel-Palestina -, mas fato é que o coloquei na lista de desejados do Skoob, algum tempo depois ele apareceu para troca e mais que rapidamente, solicitei o livro. E aí ele chegou e ficou na estante parado por um tempo, até me saltar aos olhos quando estava procurando uma leitura rápida para fazer entre conexões e aeroportos.
"De repente, uma batida na porta" não foi nada do que eu esperava, até porque, eu não sabia exatamente que expectativa deveria ter com ele. Confiei numa indicação sem sequer ler a sinopse e acho que estava esperando algo como propaganda política em forma literária, alguma coisa tipo Orwell… e o que encontrei foi humor e absurdo, quase como escorregar pela toca do coelho rumo ao País das Maravilhas. Algumas vezes de forma bastante literal, como no caso do narrador mentiroso compulsivo, que atravessa um buraco no chão para uma realidade em que todas as suas mentiras são uma realidade e ele é confrontado com as consequências delas.
Os contos têm temáticas bastante ecléticas, alguns com situações até realistas, outros entrando pelo completo nonsense, mas, mesmo recheados de humor, apresentando um retrato humano compassivo e autêntico. A violência que eu meio que esperava das histórias, se imiscui em algumas das narrativas, mas não é o eixo da coletânea. Há contos em que tocamos tangencialmente nos conflitos da região - como no que a protagonista é chamada a identificar o corpo de seu marido, um homem com que ela se casou apenas para fugir ao alistamento obrigatório no exército israelense e que conheceu apenas superficialmente no dia do casamento - mas Keret parece mais interessado em tratar do ser humano de uma forma geral e não se restringir à realidade de seu país.
O que mais me tocou, na verdade, foram seus retratos de solidão moderna. O conto em que um homem se deixa confundir com outras pessoas num café para poder ter algum contato humano me partiu o coração, bem como a história sobre o cinegrafista que decide fazer um documentário e sair batendo de porta em porta para perguntar o que as pessoas fariam se tivessem um peixe dourado para lhe conceder três desejos.
Por vezes cínico, por outras, excêntrico, mas sempre bastante humano, "De repente, uma batida na porta" foi um livro que fiquei feliz por ter dado uma chance, por ter ido atrás meio que às cegas. É uma boa coletânea, cheia de pequenas surpresas e eu definitivamente leria outras obras do autor.
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