rayssadioli 03/06/2024
O livro é constituído por poesias, que são, no decorrer do livro, nomeadas como liras. A ficção aqui se mescla com a realidade, já que o autor se coloca na história através do pseudônimo ?Dirceu?, que escreve para a sua amada Marília, que na realidade corresponde ao amor da vida de Tomás, Maria Doroteia.
Por ser escrito durante o período em que o ?Arcadismo? predominava na literatura, o chamado ?Setecentismo?, as poesias, as quais compõem uma narrativa, contempla todos aqueles traços principais do Arcadismo, como o tom bucólico, a fuga da cidade em direção ao campo, o famoso lema ?Carpe Diem?, que significa basicamente que temos que aproveitar a vida porque esta é passageira (isso é visto com recorrência principalmente na primeira parte), além toda aquela oposição ao ?exagero? do Barroco.
As liras, apesar do vocabulário mais antigo, são até tranquilas de serem lidas. No entanto, acredito que não consegui extrair muita coisa do que o autor visava transmitir devido à minha experiência pouco consolidada com leitura de poemas no geral, mas o pouco que consegui captar foi incrível, já que a forma como ele escreve para a sua amada é realmente encantadora e única.
Na escrita, há predominância de inversões, o que pode dificultar, mas gostei bastante do modo como ele estrutura seus versos, uma vez que esse conjunto de alterações, como no caso das inversões, por mais que dificulte à primeira vista, torna a escrita única, ficando até mesmo divertido de ler. Mas o que me deixou mais dificuldade de interpretação foram os sonetos no final, que, por apresentarem estrutura fixa, resultam em uma leitura menos fluida e, consequentemente, exige mais do leitor. Sendo assim, espero conseguir relê-los em momento mais oportuno, de maneira a ver se consigo compreender mais destes sonetos, que não foram tão bem compreendidos por mim na primeira leitura.
O autor faz diversas referências à mitologia ao longo das liras, o que muito me agradou, já que me interesso bastante pelo assunto, e a forma como ele relaciona o conteúdo das liras (que basicamente tem Marília como centro) com a mitologia é impressionante, sendo que a musicalidade contida nos versos contribuem ainda mais para que a contemplação do leitor se dê com mais intensidade.
Há também referências aos eventos históricos vividos pelo autor, com destaque para a Inconfidência Mineira, em que Tomás é participante, sendo preso e depois exilado em Moçambique por conta disso. No livro, essas mudanças em sua vida são marcantes na estrutura do livro, que é dividido em três partes, contendo na primeira parte mais esperança e um amor, de certa forma, mais ?leve?, já na segunda parte a melancolia se expressa mais intensamente (se assemelhando mais ao Romantismo que ao Arcadismo propriamente dito), o que ocorre devido ao lugar em que as liras foram escritas, em uma prisão no caso. Assim, nessa parte ele se dirige à Marília com pessimismo e tristeza, sendo possível perceber e sentir seu medo de perder para sempre a amada.
Há discordâncias em relação à primeira parte ser de sua autoria, mas eu, por não ter conhecimento suficiente sobre o autor, prefiro me abster de fazer comentários acerca dessas discussões.
Gostei mais do livro do que pensei que fosse gostar, o que acho que se dá principalmente pela forma do autor se expressar, tornando possível sentir seus sentimentos, e sua escrita contribui bastante para isso, que, apesar de difícil de ser lida nos dias atuais, consegue representar o amor de Dirceu de forma delicada e etérea, além das várias alusões aos deuses da mitologia grega, que também auxiliam nessa construção, a qual, como já dito antes, torna-se distinta de tudo já escrito até então. Devido a isso, essa leitura também despertou um interesse em mim por poesia, de forma que pretendo começar a ler mais livros desse tipo. Em síntese, acho que o livro fez jus ao seu sucesso devido à experiência única que este pode proporcionar se lido com calma e atenção.