Amélia Galvão 17/06/2017Favorito <3Parafusos é um quadrinho autobiográfico, em que a autora por volta dos seus 30 anos se descobre bipolar, ocasionando um grande dilema enfrentado pela protagonista: se a tomada de medicamentos iria interferir negativamente na sua criatividade.
No começo do quadrinho encontramos a personagem em sua fase maníaca, que é brilhantemente representada pela artista. Ela procura explicar, utilizando-se de palavras, ilustrações e humor, alguns sintomas que ocorrem na fase da mania, como, por exemplo,o aumento na autoestima e da libido. No entanto, o que mais me chamou a atenção foi como a autora soube se aproveitar da nona arte para tentar transmitir o comportamento de alguém na fase de mania. Há páginas que são assoladas de palavras e ideias, que mudam rapidamente e muitas vezes podem não fazer muito sentido, e a forma como estão organizados os quadros passam uma sensação de certa bagunça, refletindo justamente a desorganização e rápida mudança de ideias que acontece na mente de alguém em mania.
Achei interessante que ao ser diagnosticada a própria autora admite que possuía preconcepções românticas do que seria um artista louco. Infelizmente, muitas pessoas nutrem uma idealização da "loucura" como se fosse simplesmente um dom causador da criatividade e esquecendo do outro lado da moeda, que é todo o sofrimento ocasionado por ser portador de um transtorno de humor. A própria autora mostra o quão incapacitante o transtorno se mostrava para ela, principalmente na fase de depressão, em que ela vivia com o sentimento de esgotamento constante, diminuindo drasticamente a sua produtividade. Inclusive há um trecho em que a autora escreve que não gostaria de ter seus sofrimentos como fonte de inspiração para sua arte, porque eles são uma droga.
Também vemos no quadrinho um drama vivido por muitos pacientes, a dificuldade em encontrar a combinação certa dos medicamentos, o que era agravado nesse caso pela utilização de entorpecentes pela autora. Quanto a isso observamos o amadurecimento da personagem ao longo do quadrinho, que vai percebendo que certas mudanças em seu comportamento e hábitos são necessárias para a conquista de uma melhor qualidade de vida.
Enfim, amei a leitura e acredito que é um quadrinho interessante tanto para aqueles que nunca tinham ouvido falar em transtorno bipolar, como para os que conhecem alguém que o possua ou para os que o têm. Ele nos ajuda a entender melhor o transtorno e a nos colocar no lugar do outro, bem como traz um sentimento reconfortante de que você não está sozinho nessa e de que é possível sim conviver, e viver bem, com a bipolaridade. É uma leitura que trata de um tema denso, mas que consegue utilizar do humor para a tornar mais leve.