Gabriel.Maia 13/10/2022
"Existe algo mais perigoso do que deuses insatisfeitos e irresponsáveis que não sabem o que querem?"
Você já parou para pensar que nós estamos vivemos o auge de uma das mais impressionantes revoluções da história? A revolução científica, que começou a aproximadamente 500 anos junto com o renascimento, moldou, paralelamente ao capitalismo e ao imperialismo moderno, as bases da nossa sociedade e cultura. Se antes da revolução científica, o comum e esperado dos governantes era manter a sociedade e os costumes como eram, ou até retornar às épocas de ouro, nos últimos tempos até mesmo os governos mais conservadores fazem promessas de melhoria e avanço em diversas áreas, e, apesar dos pesares, muitas vezes cumprem o prometido. Porém, como o autor coloca nas primeiras partes do livro, a revolução científica não é, nem de longe, a primeira da nossa história. Yuval divide nossa história em 3 principais revoluções: a revolução cognitiva, ocorrida há cerca de 70 mil anos atrás; a revolução agrícola, há aproximadamente 12 mil anos; e, por fim, a atual revolução científica, que já expliquei no começo dessa resenha. Todas foram de suma importância para o domínio do homo sapiens sobre o planeta terra, e cada uma tem suas particularidades.
A revolução cognitiva, de acordo com o autor, ocorreu no momento em que os homo sapiens primitivos adquiriram a habilidade de inventar e contar histórias ficcionais. Não é nenhum segredo que a comunicação é um dos principais pilares para a nossa evolução (particularmente, considero o principal fator), já que é através dela que conseguimos espalhar conhecimentos adquiridos com as pessoas do nosso entorno, evitando que o conhecimento morra conosco. O problema é que, antes da revolução cognitiva, nós só conseguíamos expressar acontecimentos reais, coisas do cotidiano como o avistamento de um leão, o achamento de uma árvore frutífera, entre outros, e esse era um fato muito limitante, pois impedia que o ser humano usasse todo o seu potencial de imaginação. Quando começamos a inventar histórias de deuses, seres míticos e lendas passamos a nos sentir parte de algo maior, e, com isso, passamos a conseguir trabalhar melhor em equipe. Graças às nossas histórias e deuses, passamos a conseguir nos organizar em grupos muito grandes e com muita flexibilidade, e esse foi o primeiro passo na dominação da cadeia alimentar pelo homo sapiens.
A revolução agrícola foi a passagem do estilo de vida nômade para o estilo de vida sedentário. Antes dependíamos de caça, pesca e coleta para sobrevivermos, o que nos obrigava a buscar novos assentamentos regularmente para evitar a escassez de recursos, porém com a revolução agrícola isso não era mais necessário. Com a domesticação de animais e plantas, e com a evolução rápida dessa domesticação, nós passamos a nos organizar em assentamentos fixos, que viriam a se tornar as primeiras cidades. O autor gosta de dizer durante o livro que a revolução agrícola foi uma das maiores farsas da história, pois graças a ela nossa dieta ficou muito mais pobre, dependendo principalmente de trigo e outros cereais, que não forneciam toda a variação de nutrientes que conseguíamos por meio das caças e coletas. Outro ponto levantado para defender essa afirmação foi a de que passamos a trabalhar muito mais que antes nas lavouras, para aumentar a safra e com isso ter maior conforto e qualidade de vida, porém os excedentes não iam para os trabalhadores, e sim para as classes favorecidas como os governantes e sacerdotes, além de que, com o excedente, a população aumentava também, fazendo com que precisassem trabalhar cada vez mais.
A revolução científica é a última revolução colocada pelo autor, e é a revolução que estamos fazendo atualmente. Após a idade média, considerada pelos renascentistas como "a idade das trevas", a humanidade passou a ter menos restrições religiosas e sociais, em parte, graças à ascensão da burguesia, o que gerou uma época de muita evolução científica, que acabou beneficiando todas as áreas do conhecimento humano. Graças ao capitalismo crescente, ao imperialismo e ao cientificismo, os humanos modernos conseguiram evoluir muito mais rápido do que seus ancestrais pré-modernos, e tal evolução se traduziu tanto em guerras mais sangrentas como em medicamentos mais efetivos, provando que todas as revoluções tiveram seus lados negativos e positivos, porém todas mudaram a sociedade de forma abissal.
A apresentação das revoluções foi a parte que mais me agregou no livro inteiro, porém o autor faz diversos outros levantamentos muito interessantes, como é o caso do poder do dinheiro. Um pedaço de papel não vale um quilo de arroz, a não ser que todos os envolvidos na transação acreditem nisso. Antes da popularização do dinheiro, a troca era muito mais frequente entre os integrantes de qualquer sociedade, porém essa troca não permitia que formassem uma economia mais complexa, e foi com a ascensão do dinheiro e do crédito que demos o passo inicial em direção ao capitalismo.
Yuval também faz alguns comentários sobre o que espera para o futuro da humanidade, divagando mais do que pontuando, e ele consegue nos passar apreensão e empolgação ao mesmo tempo com suas divagações ao final do livro. De obesidade global à erradicação da fome, são vários os cenários possíveis para o nosso futuro, e, como o autor diz, "Bons argumentos podem ser apresentados para corroborar qualquer um desses desfechos, mas não há como saber com certeza. Em algumas décadas, as pessoas vão olhar para trás e pensar que as respostas para todas essas perguntas eram óbvias".
Enfim, esse é um livro indispensável para quem gosta de história e quer começar de algum ponto, afinal, nada melhor do que começar conhecendo os responsáveis por escreverem a história. Yuval tem um estilo de escrita bem parecido com o do Carl Sagan, bem didática e provocativa em alguns momentos, o que acaba te prendendo ainda mais nessa leitura tão gostosa e proveitosa. É um livro que muda a maneira como vemos o mundo, que nos ajuda a entender um pouco mais sobre como nossa sociedade funciona e nos auxilia a pensar de maneira mais clara sobre o futuro, e não tem como acabar esse livro pensando da mesma maneira que antes.