Amanda 22/03/2021
Mais um thriller psicologico do universo sombrio e fascinante de Highsmith
Patricia Highsmith tem uma escrita fluida, clara e envolvente e neste thriller psicológico somos imersos no relacionamento, sustentado por aparências e mentiras, de Vic e Melinda. Este casal à beira do abismo é o pano de fundo para a construção de uma mente doentia da qual, em poucos capítulos, acabamos virando cúmplices.
Vic, um marido fiel, resiliente e estranhamente pacífico que aceita as traições da sua esposa, Melinda. Mais do que isso, eles tem um acordo pouco comum: ela pode ter quantos amantes desejar desde que não arraste o casal e a filha para o caos de um divórcio.
Mas até onde vai o limite de alguém? Ou, até que ponto este alguém pode suportar ser traído?
Por brincadeira, Vic insinua ter matado um dos possíveis amantes de Melinda, mas após a descoberta do real assassino, algo muda dentro de Vic e vamos percebendo que uma pessoa de comportamento exemplar pode, a qualquer momento, colocar pra fora toda sua raiva e frustração reprimidas, da pior maneira possível.
Highsmith traz a tona a multiplicidade de personagens que cabem em cada ser humano e como somos [ou não] capazes de expô-los.
O machismo estrutural é outra arma usada pela autora para tornar o leitor conivente. As atitudes de Vic são questionáveis, mas estamos tão apegados à sua história de marido inofensivo, cidadão atencioso e bom pai, que fazemos “vista grossa” e, ao final da leitura, duvidamos da nossa própria moral e ética.
Esta é a intenção a autora e pagamos um preço por isso. Ao final, ela joga na cara do leitor, o próprio preconceito, o próprio machismo e praticamente grita “ Você foi cúmplice, olha só quem você defendeu. Você foi conivente agora veja o que aconteceu… Sinta-se mal, sinta-se péssimo.”
Esse é o universo sombrio e fascinante de Patricia Highsmith. Para ela, o que realmente importa é fazer um amplo estudo psicológico dos personagens e, no caso desta obra, nos fazer mergulhar nas “águas profundas” da mente de Vic e acessar toda sua excentricidade e perversão.
Patricia Highsmith nasceu em 1921 em uma família disfuncional onde era constantemente abandonada pela mãe ou simplesmente levada para os casamentos tumultuados desta. Ainda na adolescência, reconheceu seu amor pelo mesmo gênero, o que para a época, era algo sem solução. Já adulta, mudou-se para a Europa e passou a ter uma vida solitária. Como pessoa, era descrita como “cruel”, “perversa” e “brilhante”. E todos os seus protagonistas, parecem carregar estas mesmas características.
Para muitos leitores, a escrita desta obra pode ser confundida como lenta, mas trata-se de um thriller psicológico e, portanto, realmente não encontraremos dinâmicas investigativas e ações policiais.
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