spoiler visualizarTatiana 26/05/2016
O começo do livro já foi uma enorme surpresa pra mim: depois de anos, eu estava sendo novamente agraciada com as descrições da Irlanda que só mesmo a Nora consegue fazer. Você tem vontade de viver na Irlanda depois de tantas coisas lindas que lê, ainda mais se você já leu outras obras dela que se passavam no país e que já te deixaram apaixonada por lá mesmo sem ter posto seus pés naquela terra.
Então eu já comecei a leitura amando ver a mudança de ambiente e torcendo muito pra que esse livro não me decepcionasse como o primeiro da trilogia. Posso dizer que ele não me decepcionou, mas também não me arrancou os suspiros que tantos outros já fizeram.
Somos apresentados à Erin McKinnon, uma prima distante de Adelia que vive na Irlanda e que morava ao lado dela, na verdade, mas que nunca teve uma relação tão próxima assim pra ter citado citada inúmeras vezes no livro anterior. E diferentemente de Adelia, Erin possui uma personalidade forte que não se mostra visível somente quando é provocada - ela é uma pessoa de muita independência mesmo sem ser obrigada a demonstrar seus traços.
Logo que a conhecemos, já somos apresentados aos seus defeitos: ela inveja sua prima, que veio do nada e hoje tem tudo. Mas não se trata daquela inveja que você simplesmente quer tudo pra si e não se importa com mais nada - é uma mais natural, que a faz querer algo também, mas sem detrimento daquilo que o outro tem. Erin mesmo explica isso a si mesma e, apesar de eu entender que é algo que vem naturalmente, ainda me incomodava um pouco o fato dessa inveja estar tão atrelada ao orgulho que a personagem tinha. E mais, além dessas duas características, logo após conhecer Burke, Erin não se mostra nem um pouco simpática - não que ela devesse ser, considerando que estava pessoalmente na defensiva pelo modo como ele a olhava e a fazia se sentir, mas me peguei pensando várias vezes por que cargas d'água ela tinha que ser tão ríspida às vezes. Bom, talvez seja uma coisa de personalidade mesmo.
Daí o livro te joga na cara um plot twist que realmente eu não estava esperando. E a partir de então até meados do livro, ele se desenvolve muito bem - a relação entre os dois não tem nada doentio e nem mesmo abusivo, não só porque não são personagens que apresentassem essas características antes, mas porque os dois sabem muito bem se impor um ao outro. (Pausa para: nunca disse que os relacionamentos abusivos acontecem porque alguém deixa ou qualquer coisa do gênero, pelo amor de Deus! Não tem nada disso!) Eles demonstram seus sentimentos aos poucos e o relacionamento simplesmente flui.
Porém, depois de uma noite de paixão que em nada me agradou por apresentar TANTOS problemas, principalmente de ordem abusiva... Acontece aquilo que eu não gostei no primeiro livro da trilogia e que já tem se mostrado algo terrível de engolir desde muito antes de ler essa trilogia: o casamento de conveniência. Erin se casa com Burke porque ela o ama, assim como ele a ama. O problema é que ele nunca lhe disse isso. E desde que se casam, começa de novo aquela velha história do homem querer poupar a mulher de tudo, como se ela fosse uma boneca de porcelana muito frágil e só ele tivesse capacidade de resolver as coisas. Ela se transforma naquilo que sempre temeu ser, uma "concubina" - está sempre onde o marido precisa que ela esteja (e o deixa feliz por isso), mas não recebe confiança nenhuma para ser o refúgio dos seus problemas, seus segredos, nada. Ele não se abre, não diz nada sobre seu passado (que ela, aliás, só descobre com a irmã dele - outra relação MUITO estranha nessa história) a ela e também não lhe dá todo o crédito pelo amor que ela sente, pois como ele acha que são muito parecidos, pensa que ela está com ele por causa de seu dinheiro.
Isso me tirou do sério, de verdade. Eu odeio quando isso acontece na vida real e na ficção. Ela mostrou de várias formas que o amava, mas ele não enxerga isso. Ela disse que o amava, e ele ouviu mas não quis entender. Eu detestei ver que, além do relacionamento íntimo dos dois também começar de uma maneira abusiva, ele continuava problemático. Afinal de contas, COMO é possível um casamento acontecer se nem cumplicidade existe entre o casal? Eu entendo que romances explorem essas facetas da realidade (porque infelizmente isso acontece mesmo) e também mostrem fantasias que muitas pessoas acreditam acontecer, mas isso não foi nada legal, ainda mais com o que acontece a seguir.
O cavalo mais valioso de Burke é dopado e uma investigação começa a acontecer. O pior de tudo não é a investigação ou o que acontece a seguir, mas sim as consequências que vêm a seguir. O Burke teme pela vida da Erin, e ao invés de ficar ao seu lado, ele se AFASTA! ISSO NÃO FAZ O MENOR SENTIDO! E ainda tem o agravante da Erin ver tudo isso como uma forma não de questionar seu marido, mas de tentar mostrar cada vez mais que ela pode ser uma "boa esposa", que na verdade significa ser ainda mais conveniente para ele! Gente!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! Está tudo errado aqui!
Esses acontecimentos finais, que deveriam só reforçar o amor entre os dois e melhorar o relacionamento deles, fez com que tudo ficasse absurdo, na verdade. A não ser nos momentos finais, ela não o questiona sobre seus sentimentos, sobre como suas ações a afetam ou mesmo quando ele está errado - algo que ela fazia SEMPRE quando ainda não eram casados. A impressão que eu tenho é que, novamente, a personagem principal se anula completamente em favor do marido. E isso é tão errado em tantos níveis que eu não sei nem me expressar com palavras.
No geral, gostei desse livro, e se comparado ao livro anterior, esse melhora muito mais que 50%. Mas o final novamente deixou muito a desejar - MUITO. E mais uma vez, eu termino a leitura com medo do que esperar do próximo livro, ainda que ele seja uma releitura pra mim. O que me assusta mais, eu acho, é o fato de já ter lido Coração Rebelde e de sempre tê-lo considerado como um dos meus favoritos. Não sei o que esperar, de verdade, porque sei que os últimos anos me mudaram muito, ainda mais com a consciência que ganhei a respeito do feminismo.