lucasfrk 29/07/2022
Rei Arthur e os cavaleiros da Távola Redonda ? Resenha
A figura do Rei Arthur corresponde a um personagem literário da cultura medieval britânica. Apesar de não haver provas históricas de sua real existência. Em verdade, ainda não existe consenso entre os estudiosos e historiadores sobre a origem e real existência de Arthur, mas acredita-se ter sido o líder associado aos militares romanos durante os séculos V e VI e, responsável por impedir invasões saxônicas na Britânia (uma província romana que ocupava a atual Grã-Bretanha).
Alguns estudiosos acreditam que as referências ao rei sejam apenas uma singela homenagem feita à figura mitológica de um urso celta, com nome parecido (seu nome, inclusive, remete à palavra ?pedra? ou grande urso, onde daí muito provavelmente Tolkien tiraria o nome ?Aragorn?). Outra teoria, por outro lado, diz que Arthur é o vocábulo derivado de ?Arcturus?, a estrela próxima à Constelação Ursa Maior.
O relato do Rei Arthur foi também chamado de Ciclo Arthuriano (ou Matéria da Bretanha), tendo como contexto a Alta Idade Média, exatamente quando a Bretanha estava sendo cristianizada. Por essa razão, conviveram com as crenças pagãs e a magia com celebrações peculiares a dos cristãos. Celebrado em verso e em presa por todo o período medieval, seus mitos sobreviveram o bastante para inspirarem diversos romances, livros, filmes, e até videogames, sobrevivendo uma tradição em pleno século XXI.
A Grã-Bretanha sofreu várias invasões. Nessa estrutura histórica-social despontam heróis como Beowulf e o Rei Arthur, cujas lendas e mitos orais desenvolvem-se por toda a Idade Média. Beowulf, considerado o primeiro herói inglês, converge com as lendas arthurianas através de sua gênese celta, cujo papel se baseava na unificação dos povos por meio de uma narrativa discursiva. No entanto, ambos divergem na medida em Arthur, não sendo um herói solitário preocupado com suas próprias conquistas, age politicamente em favor do povo que governa, sem hierarquia, na Távola Redonda (uma vez que tal formato foi uma estratégia para evitar disputas de poder, já que, em uma mesa redonda, todos, geometricamente, estão em pé de igualdade). Arthur não possui habilidades pressupostas, mas adquire-as por intermédio de conselheiros e/ou figuras de autoridade ? esse é o caso do mago Merlin, central nas decisões do rei e nos acontecimentos do reino de Camelot.
A primeira vez que o nome de Arthur surgiu foi em ?Historia Brittonum? (História Britânica), livro escrito em 828 pelo monge Nennius. Mas esse Arthur era apenas um guerreiro. Foi apenas em 1136, com Geoffrey de Monmouth, em ?Historia Regum Britanniae? (A História dos Reis Bretões), que Arthur tornou-se rei ? e também surgiram o mago Merlin, que dá o tom sobrenatural típico da cultura celta, além de outros personagens centrais. Contudo, foi nos textos de Chrètien de Troyes (1135-1191) que a história do rei tornou-se literatura épica, e passou por um processo moralizante, absorvendo a noção de pecado e da conduta casta, correspondentes aos valores de cavalaria da época.
Geoffrey Monmouth e Chrètien de Troyes foram os primeiros a descrever uma mitologia completa do rei Arthur. Escritores mais tardios acrescentaram detalhes diferentes, como o poeta do século XIII, Robert de Boron. Posteriormente, obras como ?A Morte de Arthur?, de Sir Thomas Mallory, de 1485, e o poema ?Idílios do Rei?, de Alfred Tennyson, lançado em 1859, acrescentaram novos componentes aos personagens do Ciclo Arthuriano. No século XX, o Rei Arthur esteve mais vivo do que nunca através do cinema e das histórias em quadrinhos. A escritora americana Marion Zimmer Bradley recontou a lenda de Arthur sob a perspectiva feminina na obra ?As Brumas de Avalon?, de 1979.
As lendas do Rei Arthur também interessaram vários escritores americanos, que fizeram versões ilustradas e popularizaram o mito. É o caso de ?O rei Arthur e seus Cavaleiros?, de Howard Pyle, de 1903, que se empenhou em apresentar o romance para o público estadunidense ? não esqueço também de citar a trilogia de Bernard Cornwell, ?As Crônicas de Arthur?, escrita nos anos 1990, e responsável por reviver e envernizar esse mito na contemporaneidade.
Este livro relata as batalhas de Arthur com o Cavaleiro Negro e com o Duque da Nortúmbria, e seus esforços para manter consigo a lendária espada Excalibur; seu amor por Lady Guinevere e as origens da Távola Redonda; Merlin, traído pela feiticeira Vivien, além de Morgana e a Dama do Lago; Sir Pellias, Sir Gawaine e tantos outros nobres cavaleiros. E, ao fim, vê-se formulado o enigma do futuro da Távola Redonda e, evidentemente, da vida de Arthur.
A edição comentada e ilustrada da Zahar inclui 41 ilustrações e um texto integral, do primeiro livro de Pyle sobre a saga de Arthur. A linguagem e a diagramação do livro são inspiradas nos textos medievais, com resumos da história em pequenos destaques ao longo do texto. É certo que tal recurso gera uma certa náusea na medida em que expõe de mais os fatos estabelecidos em cada capítulo, deixando o leitor já ciente do clímax de cada sessão. A linguagem, adaptada ao público estadunidense, é demasiadamente jocosa, beirando ao infantil (o que por si só não é algo ruim, mas fica a reflexão: precisou dar um verniz juvenil para que o público norte-americano absorvesse a lenda arthuriana?).
As ilustrações, ainda que signatárias de um trabalho solícito e dedicado, apresentam-se uma forma igualmente repetitiva (basta perceber que todas as figuras, masculinas e femininas, permanecem no mínimo muito semelhantes), de forma não realmente ?ilustra? a narração, mas esbarra na imaginação pessoal do leitor, parecendo mais um adereço estético inútil do que qualquer outra coisa.
Em última análise, a jocosidade transmite um tom leve, e, ainda que demasiado repetitivo, é agradável de se ler. Já que as lendas do ciclo arthuriano estão repletas de temas como traição, vingança, cobiça, inveja e morte, é importante que exista uma versão mais ?manso?, digamos.