Tiago Bessa 19/07/2018
I-Juca Pirama, de Gonçalves Dias
Análise da obra Gonçalves Dias publicou o livro Últimos cantos e deve ter sido escrito entre 1848 e 1851, e na obra se encontra o poema I – Juca Pirama.
I – Juca Pirama é considerada pelos críticos como um dos mais elaborados poemas do Romantismo brasileiro.
O título do poema é tirado da língua tupi e significa, conforme explica o próprio autor, “o que há de ser morto, e que é digno de ser morto.” Embora tenha nome próprio, “Juca Pirama” não tem nada a ver com o nome do índio aprisionado pelos Timbiras.
Apesar de ter uma fama narrativa que configura o gênero épico e um conteúdo dramatizável, predomina no poema o gênero lírico – um lirismo fácil e espontâneo, perpassado das emoções e subjetividade do poeta. Como é próprio do romantismo, estilo a que está ligado Gonçalves Dias, é um lirismo que brota do coração e da “imaginação criadora” do poeta e que expressa bem o sentimentalismo romântico. A obra é indianista e vale ressaltar a musicalidade dos versos que é uma característica típica de Gonçalves Dias. O poema I–Juca Pirama nos dá uma visão mais próxima do índio, ligado aos seus costumes, idealizado e moldado ao gosto romântico. O índio integrado no ambiente natural, e principalmente adequado a um sentimento de honra, reflete o pensamento ocidental de honra tão típico das novelas de cavalaria medievais - é o caso do texto Rei Arthur e a Távola Redonda. Se os europeus podiam encontrar na Idade Média as origens da nacionalidade, o mesmo não aconteceu com os brasileiros. Provavelmente por essa razão, a volta ao passado, mesclada ao culto do bom selvagem, encontra na figura do indígena o símbolo exato e adequada para a realização da pesquisa lírica e heróica do passado. O índio é então redescoberto, embora sua recriação poética dê idéia da redescoberta de uma raça que estava adormecida pela tradição e que foi revivida pelo poeta. O idealismo, a etnografia fantasiada , as situações desenvolvidas como episódios da grande gesta heróica e trágica da civilização indígena brasileira, a qual sofre a degradação do branco conquistador e colonizador, têm na sua forma e na sua composição reflexos da epopéia. da tragédia clássica e dos romances de gesta da Idade Média. Assim o índio que conhecemos nos versos bem elaborados de Gonçalves Dias é uma figura poética, um símbolo. Gonçalves Dias centra I – Juca Pirama num estado de coisas que ganham uma enorme importância pela inevitável transgressão cometida pelo herói, transgressão de cunho romanesco (o choro diante da morte) que quando transposta a literatura gera uma incrível idealização dos estados de alma. Como exemplo, podemos citar as reações causadas pelo "suposto medo da morte". Com isso, o autor transforma a alma indígena em correlativos dos seus próprios movimentos, sublinhando a afetividade e o choque entre os afetos: há uma interpenetração de afetos (amor,ódio, vingança etc.) que estabelece uma harmonia romântica entre o ser que está sendo julgado e a sua natureza - a natureza indígena, com a consequente preferência pelas cenas e momentos que correspondem ao teor das emoções. Daí as avalanches de bravura e de louvor à honra e ao caráter. Foco narrativo I – Juca – Pirama é narrado em 3ª pessoa por um índio timbira que relata às gerações posteriores as proezas do guerreiro tupi que lá esteve. A posição do narrador é distante, revelando-se onisciente e onipresente. O poema descreve, a partir de um “flash-back”, a estória de um índio tupi que, por ser um bravo e corajoso guerreiro, deveria ter sua carne comida numa cerimônia religiosa (antropofagia). Tempo / Ação / espaço O autor, através do narrador timbira, não faz menção ao lugar em que decorre a ação; sabe-se, entretanto, que os timbiras viviam no interior do Brasil, ao contrário dos Tupis, que se localizavam no litoral.
Quanto ao tempo, não há uma indicação explícita, mas percebe-se que é a época da colonização portuguesa, quando os índios já estavam sendo dizimados pelo branco, como diz, no seu canto de morte, o guerreiro Tupi – um triste remanescente “da tribo pujante/ que agora anda errante”.
Personagens I - Juca Pirama - típico herói romantizado, perfeito, sem mácula que desperta bons sentimentos no homem burguês leitor. O velho tupi - simboliza a tradição secular dos índios tupis. É o pai de I – Juca Pirama. Os timbiras - índios ferozes e canibais. O velho timbira - narrador e personagem ocular da estória. Temática O índio adequado a um forte sentimento de honra, simboliza a própria força natural do ameríndio, sua alta cultura acerca de seu povo representado no modo como este acata o rígido código de ética de seu povo.
O índio brasileiro é um clone do cavaleiro medieval das novelas européias românticas como as de Walter Scott.
Estrutura da obra A metrificação de Gonçalves Dias é bastante original, pois “menospreza regras de mera convenção”. O poeta sempre busca a forma ideal para cada assunto, adequando bem forma e conteúdo.
Em I – Juca – Pirama, alterna versos longos e curtos, ora para descrever (verso lento), ora para dar a impressão do rufar dos tambores no ritual indígena.
O poema nos é apresentado em dez cantos, organizados em forma de composição épico – dramática. Todos sempre pautam pela apresentação de um índio cujo caráter e heroísmo são salientados a cada instante.
Canto 1 - Apresentação e descrição da tribo dos Timbiras. Como está descrevendo o ambiente, o autor usa um verso mais lento e caudaloso, que é hendecassílabo (onze sílabas). A estrofe é sempre de seis versos (sextilha) e as rimas obedecem ao esquema: AA (paralelas) e BCCB (opostas ou intercaladas). Canto 2 - Narra a festa canibalística dos timbiras e a aflição do guerreiro tupi que será sacrificado. O poeta alterna o decassílabo (dez sílabas) com o tetrassílabo (quatro sílabas), o que sugere o início do ritual com o rufar dos tambores. As estrofes são de quatro versos (quarteto) e o poeta só rima os tetrassílabos. Canto 3 - Apresentação do guerreiro tupi – I – Juca Pirama. Sem se preocupar com rimas e estrofação, o poeta volta a usar o decassílabo (com algumas irregularidades), novamente num ritmo mais lento, que se casa bem com a apresentação feita do chefe Timbira. Canto 4 - I - Juca Pirama aprisionado pelos Timbiras declama o seu canto de morte e pede ao Timbiras que deixem-no ir para cuidar do pai alquebrado e cego. O verso pentassílabo (cinco sílabas), num ritmo ligeiro, dá a impressão do rufar dos tambores. As estrofes com exceção da primeira (sextilha), têm oito versos (oitavas), e as rimas seguem o esquema AAA (paralelas) e BCCB (opostas e intercaladas). Canto 5 - Ao escutarem o canto de morte do guerreiro tupi, os timbiras entendem ser aquilo um ato de covardia e desse modo desqualificam-no para o sacrifício. Dando a impressão do conflito que se estabelece e refletindo o diálogo nervoso, entre o chefe Timbira e o índio Tupi, o poeta altera o decassílabo com versos mais ou menos livres. Não há preocupação nem com estrofes nem com rimas. Canto 6 - O filho volta ao pai que ao pressentir o cheiro de tinta dos timbiras que é específica para o sacrifício desconfia do filho e ambos partem novamente para a tribo dos timbiras para sanarem ato tão vergonhoso para o povo tupi. Reproduzindo o diálogo entre pai e filho e também a decepção daquele, o poeta usa decassílabo juntamente com passagens mais ou menos livres. Não há preocupação com rimas ou estrofes. Canto 7 - Sob alegação de que os tupis são fracos, o chefe dos timbiras não permite a consumação do ritual. Num ritmo constante, marcado pelo heptassílabo (sete sílabas), o poeta reproduz a fala segura do pai humilhado e do chefe Timbira. A estrofação e as rimas são livres. Canto 8 - O pai envergonhado maldiz o suposto filho covarde. Para expressar a maldição proferida pelo velho pai, num ritmo bem marcado e seguro, o poeta usa o verso eneassílabo (nove sílabas), distribuindo-os em oitavas, com rimas alternadas e paralelas. Canto 9 - Enraivecido o guerreiro tupi lança o seu grito de guerra e derrota a todos valentemente em nome de sua honra. Casando-se com o tom narrativo e a reação altiva do índio Tupi, o poeta usa novamente o decassílabo com estrofação e rimas livres. Canto 10 - O velho Timbira ( narrador ) rende-se frente ao poder do tupi e diz a célebre frase: "meninos, eu vi". Alternando o hendecassílabo com pentassílabo, o poeta fecha o poema, de forma harmoniosa e ordenada, o que reflete o fim do conflito e a serenidade dos espíritos. Casando com essa ordem restabelecida, as estrofes vêm arrumadas em sextilhas e as rimas obedecem ao esquema AA (paralelas) e BCCB (opostas e intercaladas). Enredo O poema narra o drama de I-Juca Pirama (aquele que vai morrer), último descendente da tribo tupi, que é feito prisioneiro de uma tribo inimiga. Movido pela amor filial, pois o índio tupi era arrimo de seu pai, velho e cego, I-Juca Pirama, contrariando a ética do índio, implora ao chefe dos timbiras pela sua libertação. O chefe timbira a concede, não sem antes humilhar o prisioneiro: "Não queremos com carne vil enfraquecer os fortes." Solto, o prisioneiro reencontra-se com seu pai, que percebe que o filho havia sido aprisionado e libertado. Indignado, o velho exige que ambos se dirijam à tribo timbira, onde o pai amaldiçoa violentamente o jovem guerreiro que ferido em seus brios, põe-se sozinho a lutar com os timbiras. Convencido da coragem do tupi, o chefe inimigo pode-lhe que pare a luta, reconhecendo sua barvura. Pai e filho se abraçam - estava preservada a dignidade dos tupis.
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