JPHoppe 04/12/2013
Com "O Polegar do Panda", Gould fez sua segunda publicação no que viria a ser uma duradoura e bem sucedida série de coletâneas de ensaios para a Natural History. Enquanto os temas entre si variavam muito, todas tinham um tema em comum: a Teoria da Evolução, a Biologia, e as peculiaridades que nos fazem como somos.
A começar, o título e a primeira seção do livro: do que se trata, e o que representa para nós um polegar do panda? Em primeira medida, nada demais. Pandas comem bambu. Como manipular brotos de bambu quando você tem a destreza de um urso, útil para golpear, péssima para manipular? Um dedo oponível certamente se prestaria nesse cenário. Certamente os processos adaptativos favoreceriam uma estrutura assim, e tal qual surgiu o polegar, certo?
Não. Os polegares verdadeiros dos pandas permanecem exatamente iguais aos de seus ancestrais ursos, perfeitamente adaptados para uma vida cursorial plantígrada. Uma vez assim, dificilmente podem ser convertidos para outra via. Então os ancestrais do panda deram um jeitinho: a partir de outras estruturas da mão, como o sesamóide radial e músculos associados, desenvolveu um "sexto dedo" oponível, podendo assim manipular os brotos que fornecem 99% de seu sustento.
Essas aparentes "imperfeições" da natureza que mostram o papel ativo da Evolução nos seres vivos, deixando visível seus processos e caminhos. Foram situações como essa que deram corpo e evidência para os pesquisadores de outrora, como o próprio Charles Darwin, e também de onde autores como Stephen Jay Gould buscavam inspiração para seus escritos.
Seguem-se então outros 30 ensaios, lidando com temas diversos como os cérebros humanos, mostrando que não há diferenças significativas quanto aos cérebros masculino e feminino, além de diferenças raciais (sejam elas quais forem), ou relativas ao tempo; uma nova olhada na fraude do Homem de Piltdown, com a investigação de um possível culpado na época não considerado, Teilhard de Chardin, e uma discussão sobre porque fomos enganados por tanto tempo; uma visão sem influência do conhecimento e ideologia atual acerca da posição do Dr. Down e sua descrição da Síndrome que leva seu nome; e um dos temas favoritos de Gould: dinossauros (aqui, com sua relação com as Aves).
Outro ensaio que destaco é a respeito dos dodôs de Maurício, e as árvores que supostamente ficaram sem seus dispersores, os tambalacoques. Ainda hoje é dito como uma mostra inequívoca das ações impensadas do homem: a extinção do dodô também culminou na lenta morte dessas árvores. Inclusive, assim é dito no livro, e assim foi me dito em aulas na faculdade. Quando a história é boa demais, desconfie: e assim é feito no Pós-Escrito.
Não por menos, "O Polegar do Panda" é considerado um dos melhores livros de Gould. Tanto pela fluência e elegância de seus textos, quanto pela atemporalidade da mensagem.