Maria - Blog Pétalas de Liberdade 11/12/2015Uma família desestruturada "Em segundos via-se o dia clarear em Miramar, cidade marítima Argentina, ao sudeste da província de Buenos Aires, e aceleradamente começou um novo dia - pessoas fazendo caminhadas com seus cachorros, pessoas apressadas indo aos seus trabalhos, correndo para encontrar uma mesa vazia para almoçar. Os dias passariam implacáveis. Os dias sempre passam e levam a algum lugar e, sem percebermos, chegaremos lá." (página 12)
A história é narrada em terceira pessoa e se passa, em sua maior parte, na cidade argentina de Miramar. O corretor de imóveis Solano, a dentista Amaya, o estudante de biologia Piro e a jovem Clara eram uma família, mas uma família com ligações muito frágeis. Após um certo episódio, essas ligações ficaram ainda mais fragilizadas e a família passou a se desestruturar de forma assustadoramente rápida.
E o céu de Miramar? reúne em um único livro e de forma brilhante, tramas que poderiam ser de livros de gêneros diferentes.
Solano, um homem de meia idade, começou a se preocupar excessivamente com a aparência e a se interessar por mulheres mais jovens, deixando a família de lado. Ele pagaria um elevado preço por sua vaidade.
Temos muito suspense com Amaya, uma mulher que desejava uma vida glamourosa como as que via nas revistas. Decidiu mudar de emprego e entrou para uma empresa onde ganharia muito, teria um carro de luxo, faria viagens e iria em festas de pessoas ricas. Teve que mudar seu visual completamente e até passou a usar outro nome. Sua misteriosa chefe era sua inspiração, mas esse novo trabalho parecia um pouco suspeito. A descoberta do que estava por trás da suposta empresa de vendas Brid.B mudaria sua vida para sempre (e é uma das partes mais interessantes do livro).
Piro partiu para o Brasil, mais especificamente para a Amazônia, com sua amiga Miranda e os dois filhos adolescentes dela, Martín e Alana. Ele e Miranda queriam fazer pesquisas, mas não estavam preparados para o que enfrentariam na floresta. Eles conheceram muitas pessoas boas, mas também passaram por cenas dignas de filme de terror.
"Martín já estava acordado e um pouco agitado.
- Ei! Rapaz, que cara é essa? - perguntou Piro ao ver o semblante assustado de Martín.
- A tal menina estava me observando pela abertura da barraca.
- Mas ela estava do outro lado. Eu a estava me seguindo quando Piro me chamou!
- Ela estava aqui pertinho me olhando.
- Estou ficando com medo - disse Alana." (página 216)
Clara tinha um trauma do passado e por isso não tinha bons relacionamentos amorosos. Se colocava em perigo diversas vezes, era inconsequente, tinha sorte em algumas ocasiões (ela poderia ter morrido ao ir se encontrar com um cara que conheceu na internet e que apareceu armado no local do encontro), mas não se safou do peso de suas escolhas.
No livro, conhecemos um pouco da Argentina, cidades das quais provavelmente nunca ouvimos falar, mas através das descrições do autor, é possível se sentir em solo argentino. Também são apresentadas as questões políticas e econômicas pelas quais o país passou, tornando mais realista a ambientação da trama. Conhecemos um pouco da floresta amazônica; a atuação dos madeireiros, a destruição da cultura indígena e a tão falada receptividade do povo brasileiro estão presentes na obra. Assim como os anseios e os problemas da atual juventude sul-americana.
Nada fica sem resposta na história, e é surpreendente descobrir as ligações dos personagens, o que alguns chamariam de incríveis coincidências e outros chamariam de destino. Sabe aquela história de que o mundo é pequeno? Pois é, ela é bem válida para os personagens do livro. Algumas coisas eu intuí ao longo da leitura, outras eu só fui entender após finalizá-la, e me deixaram muito surpresa.
E o céu de Miramar? é o primeiro livro escrito e publicado de forma independente pelo Oliver Fábio. Sendo um autor estreante e sem o apoio de uma boa editora, há sim algumas arestas que poderiam ser aparadas (pequenas melhorias no texto, cuidado com alguns esteriótipos e quantidade de coincidências), mas se em sua estreia, ele já escreve uma história do calibre de E o céu de Miramar?, eu acho que a gente tem que gravar esse nome, pois Oliver Fábio tem potencial para seguir os passos dos maiores escritores latino-americanos, como Gabriel Garcia Márquez e Mario Vargas Llosa, quando lançar seus próximos livros!
É impossível comparar E o céu de Miramar? com algo que eu já tenha lido, mas há uma deliciosa latinidade na obra, que me lembrou Cem anos de solidão (talvez pelo realismo fantástico do que acontece na floresta e pela ciclicidade que liga os personagens) e Travessuras da menina má (pela capacidade de interligar tempos e espaços diferentes).
O livro está muito bonito na parte visual. A capa já desperta curiosidade (repararam na mão ensanguentada saindo pela lanterna do carro? É uma das melhores e mais surpreendentes partes da história), a escolha das cores e fontes foi muito bem feita. Há uma música em cada início de capítulo e algumas ilustrações. As margens, o espaçamento entre linhas e as letras tem um bom tamanho; as páginas são amareladas.
Resenhar E o céu de Miramar? é uma tarefa difícil, há muito o que se falar e, ao mesmo tempo, não quero estragar as surpresas para os futuros leitores. Assim como é difícil definir para quem indicar a obra, já que a gama de leitores que podem gostar do livro é bem extensa. Enfim, digo que foi uma leitura surpreendente e que valeu a pena.
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