paloma 28/02/2021
E eu que descobri amar José de Alencar
Antes de falar propriamente do livro, gostaria de tecer alguns comentários acerca do autor. Alencar tido por muitos como político conservador, que prezou pela moral e bons costumes e adepto aos ideias escravagistas. Tais afirmações causaram e mim certo estranhamento e um "desencanto" para com o autor, lançando sobre sua obra certa "amargura", sendo assim decidi pesquisar um pouco sobre sua vida. E é a recomendação que deixo aqui, para além de Alencar, pesquisem sobre os autores dos livros lidos! O meu entendimento atual é que Alencar não era avesso aos ideias abolicionistas, muito pelo contrário, ele era avesso a forma como o movimento era conduzido, era contra uma emancipação que levasse o preto a exclusão e marginalização, o que de fato aconteceu. Para ele, antes que tal emancipação acontecesse seria necessária uma revolução de costumes. Utópico? Talvez, mas se assim fosse feito de forma efetiva, muitos dos traumas existentes em nossa estrutura social não teriam o impacto que possuem.
José de Alencar disse: Nem nos meus discursos e escritos aplaudi a escravidão; manifestei-me sempre de sua extinção espontânea e natural, que devia resultar da revolução de costumes?. Dessa forma, é preciso mitigar a imagem que acarreta sombras a uma escrita para além de seu tempo.
Dito isso, reafirmo agora de maneira mais pessoal: Senhora é ATEMPORAL.
Aproveito para parafrasear alguém que disse: "E eu que descobri amar José de Alencar... mas só depois de não estar mais obrigada a ler seus livros."
O livro narra a história de Aurélia, jovem rica, autêntica, linda, desejada, uma verdadeira joia da alta sociedade do Rio de Janeiro; e de Seixas, seu marido, que aos olhos de muitos é invejado por ter sido o escolhido de Aurélia para o enlace matrimonial.
Alguns pontos precisam ser destacados:
- Senhora é um livro de transição, foi escrito no final do romantismo e carrega muitas características desse gênero, assim como do realismo, gênero qual precede. Do romantismo podemos ver a grande idealização dos personagens e suas características, uma linguagem popular, um tanto "exagerada", porém rebuscada, pois a burguesia era o público alvo; por sua vez do realismo o que se faz latente é a crítica social ao casamento por interesse e aos arranjos feitos pela alta sociedade com a finalidade de transvestir a realidade com uma máscara de perfeição, quando na realidade o ambiente o era extremamente supérfluo, egoísta, mesquinho e baseado no materialismos.
- O livro é considerado como um livro de "perfil da mulher" ou ainda "livro de perfil feminino", uma vez que José de Alencar em sua obra tinha por predileção destacar mulheres "heroínas", que fugiam aos padrões da sociedade do século 19, sociedade essa extremamente machista e sexista, onde a mulher não tinha valor em si, mas em sua castidade, em seus dotes e em seu recato.
- O livro é dividido em 4 partes que fazem relação com uma transação comercial, mais uma vez deixando em evidência sua crítica aos arranjos inerentes daquele tempo. As partes são: O preço, Quitação, Posse e Resgate. Tais divisões controlam o fluxo da narrativa e a transição da história, mas não de forma linear e cronológica, uma vez que "Quitação", trata-se de um flashback onde o leitor é levado a explicação que tanto lhe faltou na primeira parte da história. Tais divisões constroem amarras bem consistentes com intuito de reafirmar em pormenores as ideias expostas pelo autor nas entrelinhas.
- A obra se encaixa perfeitamente no gênero "romântico", uma vez que atem ao principal ideal presente no romantismo: a redenção, a fim alcançar o desfecho perfeito que é o felizes para sempre.