Mr. Matos 12/07/2020
Itinerarium mentis in ultimum saeculum
Bobbio é sempre um autor bastante professoral seus textos são límpidos e claros, o que é por vezes muito difícil de achar entre autores acadêmicos, mas dentre esses Bobbio é um dos que primam pela boa comunicação com seus leitores ( textos mais claros só se recorremos ao metodo da tratadistica escolástica que funciona no esquema da tese-objeções-respostas). O livro de Bobbio é uma coletânea de artigos escritos e publicados durante a decada de 50 do século passado, uma boa parte dos textos são polêmicas onde o autor geralmente discutindo com a intelectualidade da esquerda italiana expõe conceitos como liberdade, e doscorre sobre o papel do intelectual em uma sociedade livre, e chamava seus compatriotas a ver com os próprios olhos os problemas da União soviética que mesmo figuras de altíssimo nível intelectual como Galvano Della Volpe e Palmiro Togliatti se recusavam a ver pelo seu comprometimento ideológico com o partido comunsita, Bobbio não os convidava a neutralidade mas ao julgamento crítico sobre se havia coerência da práxis com o discurso da intelectualidade comunista. O livro tem 15 artigos no total porém eu destacaria os estudos sobre Benedetto Croce que não tinham um caráter polêmico e são bastante rigorosos, no que se refere a Croce, Bobbio dedicou praticamente 4 páginas de referências bibliográficas. Os problemas com a leitura foram que em alguns momentos a leitura se tornava enfadonha pelo motivo de que parecia uma repetição em looping de uma série de lugares comuns sobre liberdades, democracia, direitos e etc, nada diferente do que se escuta ao ouvir o voto de um juiz de suprema corte ou tribunal internacional, uma autoridade diplomática ou chefe de estado ( evidentemente que exceptuando as figuras abjetas que são os senhores Ernesto Araújo e Jair Bolsonaro), ou um intelectual ou ganhador de prêmio Nobel, essa sensação de repetição travava a leitura. Entretanto, pensando na idade da obra e no seu contexto podemos ver a obra com olhos diferentes pois aquele momento Bobbio se dedicava a trabalhar para construir uma nova ordem global no pós guerra em uma europa destruída em um país desmoralizado pela sua adesão ao fascismo, o autor se esforçava para defender noções como Estado de direito, liberdades civis e direitos humanos, um esforço que evidentemente não foi apenas de Bobbio uma série de inteligências pelo mundo se dedicaram ao mesmo projeto que criaram uma espécie de Geist daquela época que embalou a produção de obras como Paz e guerra entre as nações de Raymond Aron um clássico da diplomacia, a teoria geral do direito e do estado de Kelsen, A condição humana de Hannah Arendt, a obra de Habermas a partir de Mudança estrutural na esfera pública e etc, criou-se uma concepção de mundo que é o que dá a sensação de lugar comum da obra, Bobbio ajudou a construir essa weltschaung com suas teorias gerais da política, do direito, da norma e do ordenamento. Uma sociedade onde a democracia e os direitos fundamentais do cidadão eram lugar comum, aparentemente o movimento histórico em algum monento entrou em um momento regressivo e talvez esses valores começaram a não ser mais tão valorizados, não há espaço para especular sobre quando aconteceu ou como, mas a pax pós-guerra se não morreu ainda esta na últimas, e agora a humanidade se encontra na situação como Gramsci descreveu onde "o Velho esta morto e o Novo ainda não nasceu, e nesse ínterim começam a nascer diversos sintomas mórbidos" o nacionalismo chauvinista, a burocracia internacionalista ( um kratos em démos como maravilhosamente descreveu Pierre manent em seu a Razão das Nações) o ressurgimento farsesco de Fascismos sortidos pelo mundo todo. Dessa vez seremos nós a fazer o trabalho de Bobbio, porém parece que no caminho haverá um pouco de Barbárie.
Coragem crianças o século XXI está para começar.