Alex 24/09/2017
DIFERENTES PEÇAS DE UM MESMO JOGO
O historiador Marco Antonio Villa, animado com o impeachment de Dilma Rousseff, revisitou outro momento conturbado da história política recente do Brasil: o período Collor; desde seu início improvável, com o político elegendo-se presidente por um partido inexpressivo, até o fim de seu mandato, quando, enfrentando o processo de impeachment, decidiu renunciar ao cargo.
Marco Villa é famoso por ser inimigo de Lula e, mais recentemente, criou inimizade com a base de admiradores de Jair Bolsonaro, portanto, é preciso compreender que o autor desta obra histórica tem as suas próprias aspirações ideológicas, o que pode influenciar na qualidade do conteúdo empregado.
Fernando Collor, o "caçador de marajás", é filho de Arnon Melo, jornalista e político brasileiro, que dominou durante boa parte de sua vida a imprensa de Alagoas. O ex-presidente do Brasil, apesar de pouco conhecido no resto do país, detinha um grande poder de influência em seu Estado natal, onde veio a eleger-se prefeito da capital Maceió e, posteriormente, Deputado Federal. Sem muita ligação com o grande empresariado nacional e sem influência do dinheiro estrangeiro, Collor conseguiu a façanha de eleger-se Presidente do Brasil na eleição de 1989 pelo inexpressivo Partido da Reconstrução Nacional. Vendendo uma imagem jovial e descolada, o alagoano angariou 35 milhões de votos, sendo o primeiro presidente diretamente eleito desde o período anterior ao regime militar.
O livro escrito por Marco Villa faz um resgate bibliográfico desde a época que antecedeu a eleição de Fernando Collor, até o momento de sua saída do cargo de presidente. É interessante perceber que as falas de Collor se assemelham muito às de Dilma Rousseff em 2016, se considerarmos o período em que ambos sofriam o mesmo processo para o afastamento de seus cargos. As principais alegações são a de 'estarem sofrendo um golpe', que o Brasil não poderia aceitar este 'retrocesso democrático', e que tudo isso não passava de um 'joguete de interesses obscuros' para tirá-los de seus cargos, 'ignorando a democrática escolha dos eleitores'. Trocam-se as peças, mantem-se o mesmo jogo. Outro fato muito interessante que podemos detectar, ao revisitarmos este período da história, é a menção a nomes que fazem parte dos bastidores do poder até hoje como, por exemplo, Gilmar Mendes, que à época era advogado de Fernando Collor e que, atualmente, é um dos magistrados (mais criticados, diga-se de passagem) do Superior Tribunal Federal.
Apesar do livro ser um grande amontoado de referências e entrevistas, fica a impressão de ser uma longa reportagem e não uma obra literária. Ademais, Villa peca ao tentar passar uma imagem de isenção dos fatos e acaba aliviando a barra de Collor, que deve ter ficado muito feliz com estas páginas que tornam-se, além de um livro de história, uma bibliografia "não autorizada" do primeiro presidente do Brasil a sofrer o processo de impeachment. Quem se limitar apenas à esta obra corre o risco de ficar com "pena" de Collor, e pode até mesmo considerar seu sucessor, Itamar Franco, um golpista. Mais uma vez: trocam-se as peças, mantem-se o mesmo jogo.