Paulo Silas 17/11/2017A tragédia de Júlio César aos olhos trágicos de Shakespeare. A peça, cuja história adianta o êxito da obra tanto por ela mesma, como ao considerar o seu autor, apresenta o assassinato de Júlio César e algumas de suas implicações prévias e posteriores ao crime. As motivações que ensejam no episódio da trama são desnudadas de um modo próprio, expondo-se emoções, ambições, frustrações e intenções nas falas das personagens, transmitindo-se assim ao leitor todo um ambiente específico no qual se insere o livro.
Júlio César - salvador para alguns, ditador intragável para outros. A obra parte dessa ambivalência tida aos olhos dos outros, já que não há uma imersão em fatos anteriores que levaram Júlio César a ocupar sua maior posição já tida. Inicia-se em seu auge, apresentando-se ao leitor a percepção do povo para com o então soberano e a daqueles amigos e colegas próximos. Júlio César confia naqueles que lhes são próximos, sequer podendo imaginar o mal que o ronda. Essa confiança acaba por facilitar o plano conspiratório de Cassius e Brutus, os quais se reúnem com outros conspiradores a fim de dar cabo à empreitada assassina: matar Júlio Cesar. "Et tu, Brute?" - as últimas palavras que eternizam o momento fatal da descoberta da conspiração.
César foi de fato um tirano tamanho a ponto de justificar os atos de Brutus, Cassius e dos demais que auxiliaram na efetivação da conspiração, ou teria sido uma mera vítima da mesquinharia e de sentimentos nefastos daqueles que o mataram? Seja como for, Brutus e Cassius acabam tendo de fugir, pois as consequências de seus atos passam a os perseguir. O fim da trama aqui narrada se encerra com o fim da vida desses dois.
A peça é rica justamente por expor os conflitos internos de cada qual das personagens, dito no sentido de se construir toda uma série de valores de cunho ético e moral que perpassa no plano psicológico desses. É daí que se vê Brutus, Cassius, Júlio César, Marco Antônio, Otávio e outros em diálogos coesos que evidenciam toda essa robustez de sentimentos ínsitos de cada personagem. Conforme aponta Barbara Heliodora na introdução dessa edição do livro, "o que torna a obra fascinante é o quanto Shakespeare faz os representantes das duas posições coerentes com as mesmas, o quanto eles são sinceros em suas convicções diversas e, como ele faz toda a ação da peça depender de uma sequência de ações que são, inexoravelmente, resultado direto uma das outras".
Uma peça brilhante, portanto. Vale!