Ana Seerig 30/10/2016
De acordo com a sinopse, a proposta de Wendy Leigh era "revelar o homem por trás da imagem do artista" e isso me instigou profundamente, porém não posso dizer que o objetivo foi alcançado.
Esta foi a segunda biografia que li sobre Bowie (a outra foi a escrita por Marc Spitz) e talvez por isso, por ter um parâmetro de comparação, o livro de Leigh (que faleceu no início de junho) me deixou muito a desejar. O foco definitivamente não é a música, mas ok, ao que parece era essa a intenção da autora, porém as influências, canções e vídeos do cantor e compositor são rasamente citados, o que não me parece fazer sentido, já que, de um modo ou outro, cada personagem e cada fase de David Bowie trazem uma perspectiva do homem atrás do artista.
Sem exagerar, posso dizer que metade do livro é sobre a vida sexual de Bowie, começando ainda na época em que atendia por David Jones, seu nome de batismo. Sem dúvida a liberdade sexual é uma característica um tanto significativa na história do músico, mas a atenção dada por Leigh a isso foi exagerada. É impossível entender como Bowie foi descoberto pelo mundo e se tornou um ícone. A biógrafa cita discos e entrevistas de passagem, o que importa pra ela é falar das aventuras sexuais de David e Angie. Me senti em uma roda de fofocas, onde em raríssimos momentos alguém diz algo que eu, enquanto fã de Bowie, ache importante saber.
Sou encantada por biografias, mas elas só me parecem valer a pena quando, ao fim da leitura, me sinto próxima do biografado e quando, muito tempo depois, percebo que guardei em detalhes uma história, tendo a sensação de tê-la presenciado. Não foi essa a minha sensação ao ler o livro escrito por Leigh, pelo contrário. A cada página que lia, mais ansiosa eu ficava por terminar, porque me sentia cúmplice de um abuso exagerado da imagem de Bowie.
O livro não é extenso, mas soa repetitivo e é pouco envolvente. Das 321 páginas numeradas, as 36 últimas são basicamente créditos e listas, sendo sete delas a lista de entrevistas usadas em cada capítulo - o que não me foi útil, já que as afirmações mais significativas citadas pela autora não haviam sido diretamente ditas a ela, o que aumentou a minha sensação de fofoca.
Existem inúmeras biografias sobre Bowie, mais do que eu posso contar, e essa é simplesmente mais uma delas, que foi sagazmente lançada enquanto ainda tentamos aceitar a morte de um dos artistas mais completos que a música já viu. Assim como há biografias boas e ruins, há biografias dispensáveis e há algumas indispensáveis. Bom, essa é dispensável. Não descobri o homem por trás do artista, mas descobri um monte de nomes de pessoas prontas a falar "eu conheci Bowie" para ter seus segundos de fama, incluindo a própria autora, que soube lançar o livro na hora certa.
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