Lane 21/06/2012A Catedral do MarA Catedral do Mar é a primeira obra do autor Idelfonso Falcones.
A trama se desenvolve no final do século XIV, apresentando um relato realista do começo do fim da época medieval.
Com uma narrativa precisa e detalhista repleta de fatos históricos, o autor nos remete a viver e compartilhar da vida de Arnau Estanyol.
A escrita do autor chega a ser etnográfica, Falcones se aprofunda em uma Barcelona conturbada por conflitos e tragédias, na individualidade dos personagens, envolvendo o leitor na história, demonstrando tecnicamente vários contextos históricos.
É tudo imensamente tão pormenorizado e marcante que a leitura se torna complexa, entretanto o texto não é de fácil compreensão. A textualidade do autor é didática, cheia de informações, porém eu achei que falta um pouco de argumentação, que em nada prejudica a obra.
O livro é dividido em quatro partes: servos da terra, servos da nobreza, servos da paixão e servos do destino.
A trama se desenrola tendo como pano de fundo a construção da Igreja Santa Maria do Mar, todavia a vida de Arnau Estanyol, seu nascimento, suas dificuldades, suas necessidades, sua ascensão e sua quase morte são evocadas maravilhosamente pelo autor.
Arnau Estanyol é o tipo de personagem que cativa desde o inicio. Seu caráter é único. Em alguns momentos eu fiquei até com vontade de pegar ele no colo, tamanha simplicidade deste personagem.
Sua concepção é conturbada, o senhor feudal que seu pai era servo faz valer o direito “prima nocte”, no qual o senhor feudal tinha direito a dormir com a noiva antes do marido (devo abrir um parênteses aqui e expressar que foi uma das cenas mais revoltantes que li em toda a minha vida de leitora), e após o seu nascimento a tendência de maldade só piora, determinando mudanças drásticas por toda a sua vida.
O livro detalha com precisão toda futilidade da aristocracia. Ele apresenta todo o imperialismo de uma parte da sociedade privilegiada e exploradora.
Barcelona é a cidade mais importante da Catalunha, devido a sua ascensão política e social na época, ela é considerada pelos camponeses, estes que eram tratados abusivamente pelos senhores feudais, como sendo a cidade dos homens livres.
Ela possui um enorme significado dentro da narrativa, por vezes ela se torna foco no drama deixando leitor à espreita de algo ruim a todo o momento.
Bernart seqüestra Arnau seu filho, do assédio do senhor feudal, após este ter levado o menino ainda bebê ao seu castelo para morrer. Com a esperança abrigada em conseguir sua liberdade ele foge levando seu filho para Barcelona.
A tão almejada liberdade não é assim fácil de conseguir, Bernart pai de Arnau enfrenta a decepção com sua família, onde ele procura abrigo. Mesmo diante das dificuldades e negação da família, Bernart se resigna para conseguir a liberdade pra si e seu filho.
A história é comovente, a cada página uma expectativa.
A humildade, bondade e o amor com que Bernart tem por seu filho é reflexivo, e estes valores são inseridos em Arnau desde pequeno e o leitor vai acompanhando seu desenvolvimento, ao mesmo tempo em que observa o comportamento das pessoas e da sociedade ao redor.
É inquietante observar as transformações e os extremos de uma sociedade que abriga católicos, judeus, escravos, aristocratas e assistir Arnau com seus receios e aventuras. Ver nascerem amizades, presenciar traições e humilhações e isto tudo acontece durante a construção da catedral do mar que é testemunha de cenas marcantes narradas na obra.
No entanto, o livro revela ainda guerras entre reis, a luta contra os judeus, a violência contra a mulher, as pandemias que existiam na época, os preconceitos e as hipocrisias que são retratadas com perfeição pelo autor.
Contudo, conforme cada pedra é ajustada para a construção da Catedral do Mar, o leitor é embalado pelos problemas de Arnau: a fome, seus inimigos, a guerra, a escravidão, uma amante possessiva, suas perdas e se torna expectador de sua ascensão social e financeira.
De um menino a um homem de sucesso, sem perder sua fé em sua mãe do céu, Arnau vê sua sorte mudar ao ser traído e entregue nas mãos da inquisição.
Eu não diria que a religiosidade tem um grande peso na obra, entretanto a confiança de Arnau na virgem do Mar é uma contemplação a parte.
O livro não é polêmico, mesmo abordando temas que produzem anseios no leitor, Arnau é um personagem que encanta e que faz com que a gente tenha uma cultura de admiração por ele. Porém a minha identificação vai além, poderia se dizer que Falcones produziu uma obra ficcional com teor histórico contando um romance complexo que fala de fé e opressão, narrando cronologicamente a construção de umas das mais belas catedrais marianas do mundo.
Definitivamente o livro não é pra ser lido em uma leitura rápida, é algo pra ser desfrutado em “goles” por tudo que esta história representa. Recomendo!
Avaliei com 5 estrelas.