Danii 27/06/2017
"São os pequenos querubins que nos trazem paz de espírito e nos levam a encontrar um sentido no meio dessa merda de vida."
Sabe o lado bom de ler um livro de romance LGBT (protagonizado por guris) mesmo sendo uma guria hétero e completamente iludida? Você pode multiplicar o seu amor platônico por dois! E essa é uma das razões por gostar tanto de romances LGBT, além de eles serem, é claro, super fofos e darem um grito contra o preconceito, já que toda forma de amor é sempre válida e tal (menos aquelas possessivas e violentas, aquelas dão medo).
Apesar disso, eu nunca havia lido um livro assim nacional, só estrangeiros com uma pegada mais juvenil, principalmente (porque eu tenho uma mente de adolescente mesmo já sendo uma velha de 21 anos e podendo beber legalmente nos Estados Unidos e tudo). Mas agora eu posso dizer que eu li, gostei e não me senti no meio de uma novela mexicana (o que aconteceu em alguns livros nacionais que li, alguns de nós, brasileiros, temos uma tendência para dramatizar tudo, que é uma coisa, e sim, eu estou incluída nisso).
O livro em questão é "Anjo Negro", do autor Lyan K. Levian, publicado de forma independente, que eu nem sabia que existia até o Gabriel (revisor do blog) me falar dele (Obrigada, Gabriel!). Quando eu li a sinopse desse livro, eu pedi para o ler (talvez tenha implorado, mas vamos fingir que eu tenha algum orgulho, ok?), poooooorém quando o Lyan nos falou mais sobre o livro eu fiquei com um pouco de medo de ler, porque ele não é como os livros LGBT juvenis que eu li, ele é indicado para serezinhos maiores de idade por ter palavrões, violência e uma cena homoerótica.
Pelos palavrões e pela violência eu nem ligaria, porque, bom, eu leio muitos livros assim, e até gosto de quando espancam alguém, cortam a cabeça, esquartejam... dependendo do meu humor. Já a parte erótica é quase sempre um problema em qualquer tipo de livro, porque eu devo ter uma alma conservadora, chata e recatada, e quem me conhece sabe que se começar a falar sobre isso na minha frente, eu vou ficar completamente sem jeito e tentar falar sobre qualquer outra coisa, nem que seja sobre imposto de renda. Só não fico vermelha, porque, como sou anêmica, não tenho sangue o suficiente para isso. Mas, mesmo assim, eu li, porque, bom, eu sou curiosa, e essa é uma parte incontrolável minha, bem incontrolável, na verdade. E, dessa vez, não me arrependi (ainda bem) de me deixar levar pela curiosidade. Agora, paremos de falar de mim (daqui a pouco vou parecer narcisista), e vamos (finalmente) ao livro.
"Apesar de estranhar as próprias ideias às vezes, ele não era de rejeitar o que sentia. Se a coisa estava ali, aceitava e pronto."
"Anjo Negro" é narrado em terceira pessoa e é protagonizado pelos personagens Kenan e Lucio. Tudo começa quando Kenan Russel está no seu primeiro dia em um novo colégio, no meio do ano letivo do 3º colegial, onde ele não conhece ninguém, já que se mudou para a cidade recentemente. E como ele reprovou por muitas faltas em anos anteriores, ele é três anos mais velho que todo mundo. Aí você pode pensar: "Ah! Pobrezinho, deve se sentir rejeitado, fragilizado e tímido, sem nenhum amigo", mas pensando isso você se engana, completamente, porque o Kenan logo chama a atenção, com a sua aparência de bad boy, cabelo negro longo, olhos azuis, roupas pretas, muitos colares, brincos... Uma aparência que dá medo, mas que atrai ao mesmo tempo, causando suspiros em um bando de gurias que bem que queriam que ele as jogasse na parede e as chamasse de lagartixa. Porém, ele não está nem aí para elas, na verdade, ele não está nem aí para muita coisa, só quer conseguir o diploma para deixar a mãe feliz. Ele já passou e passa por muita coisa para se deixar ser atingido pela opinião alheia. Na sala de aula ele acaba se sentando ao lado de um guri completamente diferente dele, o Lucio Corrêa.
O nosso querido Lucio, que lembra um querubim, com sardas super fofas, vive se escondendo atrás dos cabelos ruivos, tentando fazer de tudo para não ser notado, só tenta ser um bom aluno sem chamar atenção. Ele sofre bullying todos os dias (principalmente de um certo carinha, o Victor, que ama todas as oportunidades de humilhá-lo), e, muitas vezes, acaba parecendo que é completamente passivo, que nunca tomaria nenhuma atitude, sofrendo calado tudo que tem que enfrentar. Inicialmente eu queria dar uns tapas nele e sair gritando "Acorda para a vida, meu filho!", porque antes de saber os motivos dele, essa apatia toda é meio estressante.
E não fui a única que achou isso, porque ao perceber a falta de atitude de Lucio, o Kenan começa a provoca-lo também, para tentar faze-lo ter alguma reação. E quando o Lucio explode e faz alguma, as coisas começam a tomar uma direção inesperada pelos dois, pois ambos começam a notar que os dois são muito mais do que as primeiras atitudes e as aparências mostram, as primeiras impressões são apenas a ponta do iceberg, abaixo da superfície é possível encontrar coisas obscuras, mas também apaixonantes .
"É como desejar conhecer o inferno, mas não gostar do calor do fogo."
"Anjo Negro" me surpreendeu bastante, porque vai além de ser um simples romance, é um livro que é bem abrangente, desde romance com autodescobertas e aceitação, até gangues, brigas, bullying, entre muitas outras questões. E uma das coisas que eu mais gostei foram os personagens que fugiram dos estereótipos. Pare para pensar. Normalmente, quando lemos sobre algum personagem mais bad boy, motoqueiro, malandro, que faz parte de uma gangue, acabamos achando que ele é todo machão e preconceituoso, certo? Mas estamos errados. Aparências não mostram o interior de ninguém. E o fato de uma pessoa ser hetero ou homossexual não quer dizer que ela é só isso. É apenas uma das características que faz a pessoa ser ela mesma, não é uma característica para limita-la. Sua orientação sexual não precisa te fazer ser como todos esperam que você seja. Você pode ser gay e bad boy, mas também pode ser mais sensível, tímido... Você pode ser o que quiser, porque o mundo vai muito além de estereótipos, vai muito além do que pensamos só quando estamos dentro da caixa. E isso é uma das coisas que mais amei nesse livro, porque o Lyan aborda isso de maneira natural e não forçada, com uma escrita super fluída, que te faz ler o livro rapidinho, em menos de um dia.
"Quanto mais diferentes fossem, mais motivos para chacotas surgiriam."
E tudo isso me faz pensar nesse livro como se ele fosse chocolate (sou louca por chocolate), porque eu gostei muito dele, mas nesse caso ele é chocolate ao leite e não meio amargo (que é o meu preferido), porque ele não é totalmente perfeito, mas poderia ser. E isso nem é por causa das partes mais pervertidas (que prefiro nem comentar, além de que acho que nunca mais vou olhar para vaselina da mesma maneira), mas pelo fato de que senti que certos detalhes do livro podiam ser mais abordados, como mais sobre as famílias do Kenan e do Lucio, uma abordagem mais detalhada das gangues, uma maior descrição dos cenários ou até retratar a convivência dos protagonistas em período maior de tempo, porque o livro inteiro se passa em cinco dias, e fico pensando em como seria se ele se passasse, por exemplo, em cinco meses, porque acho que assim se aprofundaria mais, ou posso estar totalmente errada e estar falando abobrinha.
"Anjo Negro" é um livro curto, mas que mesmo assim atinge pontos da nossa sociedade que muitas pessoas ignoram, traz a tona muitas coisas que, muitas vezes, preferimos fechar os olhos e fingir que não existem, mas existem e ignorar não resolve nada, só acumula como uma bola de neve rolando ladeira abaixo. É um livro que te faz sentir um redemoinho de sentimentos e sensações, você fica com raiva, mas depois suspira com algo que acha fofo. Então se você quer ler um romance LGBT nacional que te faz sentir e refletir suas próprias atitudes, esse livro é mais do que indicado. Até!
"Ser rebelde sem que soubessem também tinha lá sua graça."
site: https://clubedofarol.blogspot.com.br/2017/04/resenha-anjo-negro.html