Maria Ferreira / @impressoesdemaria 04/08/2017O livro vai nos fazer conhecer Melissa, uma menina de dezessete anos, que é capaz de conjurar flores e plantas, o que a transforma em uma druida, ser do sexo feminino que possui algum tipo de habilidade, desde que se dedique para o desenvolvimento da mesma. Melissa mora no Reino de Amberlin, com seus pais e suas sete irmãs.
Um dia, durante uma aula tediosa de biologia, no meio do ano letivo, se dá conta de que está sendo observada por um garoto novo em sua classe, os dois começam a conversar por escrito enquanto a aula acontece e depois se encontram na saída, momento em que podem conversar e se conhecerem melhor. Melissa se apresenta primeiro e o rapaz fica surpreso por ela não saber quem ele era. Se apresenta como Pablo. Depois, Melissa descobrirá que ele é da família Eax, uma família rica e influente.
Pablo, apesar de toda riqueza e status de sua família, sempre foi um garoto bom, que faz doações para as instituições de caridade. Filho único de um casal recém-mudado para o Reino de Amberlin, seu maior sonho e objetivo de vida é construir uma máquina que seja capaz de voar e dedica muito de seu tempo nisso. Mas quem, como Melissa, tiver a oportunidade de conhecê-lo a fundo, conhecerá um garoto com um estilo de vida quase poético. Todos os dias ele se propõe a fazer algo que nunca tenha feito antes em sua vida, foi a forma que ele encontrou de fazer seu cérebro sempre fazer coisas diferentes e assim não cair na comodidade, ter a oportunidade de ver as coisas por outras perspectivas.
Os dois iniciam um namoro e Melissa tem que lidar com uma família em polvorosa por ela, que sempre foi a mais despreocupada para as questões do coração, estar namorando com o rapaz mais rico do reino. Melissa não é do tipo que saí por aí se gabando por seu relacionamento, mas não tem muito como escondê-lo quando se namora um rapaz tão famoso, que os jornais sempre se preocupam em divulgar suas ações, o que a faz questionar sobre onde foi parar o jornalismo de qualidade, que mais se parece uma revista de fofocas.
As druidas são proibidas de fazerem magia fora de um mosteiro, sob pena de serem presas acusadas de bruxaria. Desse modo, Melissa treina sua magia no mosteiro onde tem aulas regulamente. Sua rotina é ir para a escola, ir para o mosteiro, encontrar Pablo e visitar a vó, com quem tem uma relação muito boa e não esconde nenhum segredo. Apesar da proibição, às vezes Melissa faz conjurações fora do mosteiro, o que poderá ser usado contra ela.
Os jornais começam a noticiar o feito de uma princesa de outro reino, Isabel. Antes dos vinte anos, fez seu primeiro tratado, um projeto planejado e posto em prática por ela, ao término do terceiro, já poderia ser coroada como rainha. O seu feito foi assinar um tratado que colocava um fim na miséria do seu reino, para tanto, houve um aumento nos impostos e os ricos não gostaram nada disso, se manifestaram contra. A princesa recebeu ameaças de morte e se viu obrigada a se mudar para o Reino de Amberlin por um tempo. Foi para a casa dos pais de Pablo, já que os dois foram criados juntos, como irmãos, quando eram mais novos. Mas a presença dela na vida e na casa de Pablo novamente, não agradou muito Melissa. Não por Isabel ser uma princesa, ou ter atributos físicos inegáveis, mas porque ela já foi namorada dele.
Com o tempo, o casal terá que lidar com a diferença de classe entre eles, com o ciúmes de Melissa, com a determinação de Pablo em construir sua máquina, que o leva a esquecer do mundo ao redor por dias. Apesar dos problemas, que são parte natural de qualquer relacionamento, os dois são um casal que se dá muito bem juntos, são muito fofos e apaixonados um pelo outro.
O livro aborda questões de gênero e classe, a decadência do jornalismo e até questão de sexualidade, com um romance entre duas mulheres. A princesa Isabel do livro com certeza é uma referência a da época da escravidão, a mesma que assinou a Lei Áurea (“Mesmo com pouca idade, Princesa Isabel já mostrou que fará parte dos livros de história. O seu primeiro decreto estabeleceu a distribuição de riquezas com os menos afortunados, e, com uma assinatura, ela acabou de vez com a fome em seu reino”. [p.82]).
Certamente a mensagem que o livro passa de que nada acontece por acaso e tudo tem uma razão para acontecer, é muito bonita, mas só isso não é capaz de tornar o livro isento de alguns pontos criticáveis. Por exemplo, logo no início do livro é citada uma das melhores amigas da Melissa, Marina, mas ela nunca mais volta a aparecer na história. Como ela é uma das melhores amigas e não tem participação ativa na vida de Melissa? A escola só é usada como cenário no início, apesar de ser um lugar que Melissa frequenta diariamente. No mesmo dia que Melissa conhece Pablo, um garoto que apareceu em sua classe no meio do ao letivo, que ela não conhece e não sabe nada a respeito, ela aceita ser levada por ele para um passeio, voam de balão juntos e se beijam. Para mim, tudo acontece muito rápido, fora isso, não há um aprofundamento na questão de gênero. Melissa é uma personagem bastante perspicaz, que é consciente do que a sociedade espera dela como mulher e atua contra esse sistema, mas não passa muito disso. Apesar desse ímpeto feminista que tem dentro de si, não consegue se sentir segura em relação a Isabel pelo fato dela ter sido a ex de Pablo. Ou seja, duas mulheres que não se dão bem por causa de um homem. Por fim, não sei o que pensar exatamente da princesa Isabel que faz referência a princesa Isabel da época da escravidão. A do livro é vista como uma heroína, que livrou os pobres da miséria, mas a da vida real está longe de ser uma heroína de verdade. Além de tudo isso, há uma morte no livro que acaba com o emocional de qualquer leitor. Não que isso seja algo essencialmente negativo, porque faz com que a mensagem que o livro quer passar faça mais sentido, mas que é muito cruel da parte do autor, isso é.
Se a história apresenta alguns pontos discutíveis, é indiscutível a beleza da parte gráfica. A capa e o projeto gráfico foram feitos pelo Daniel Justi e as ilustrações da capa e do miolo pela Camila Barrera Daza. Uma capa que dialoga absolutamente com a história e uma folha de guarda magnífica, que pode se transformar em um mini pôster, sem se separar do livro. Folhas amareladas, margens grandes que garantem uma leitura mais rápida, letras num tamanho confortável, feitas as ressalvas, é uma leitura que indico sim.
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