Debora.Vilar 21/10/2018A RELAÇÃO EPISTEMOLÓGICA ENTRE MEMÓRIA E REALIDADEA mente por trás da obra 1984 é do jornalista Eric Arthur Blair, sendo George Orwell um pseudônimo. Blair nasceu em 1903 na Índia Britânica mas cresceu na Inglaterra, acredito que foi a partir de sua experiência de vida em um país colonizador, de sistema monarquista, que deve ter vindo a inspiração para escrever contra Totalitarismo e injustiças sociais; o autor também é reconhecido como simpatizante do Anarquismo.
Em 1948 após três anos do fim da Grande Guerra, que por seis anos trouxe miséria e devassidão a Europa, Orwell lança sua novela 1984 considerada, a mais famosa. A semelhança do ano de publicação (48), com o ano que dá nome a obra (84) não é mera coincidência. Há uma tese de que o autor, antevia que um futuro Totalitário não seria muito distante, então orientado pelo editor a criar um titulo mais comercial apenas inverteu os números da década de criação da obra (48), para renomear a obra com o ano de 1984.
Para alguns sociólogos como Bauman (2002), esta é uma novela futurista, e essa data segundo suas previsões seriam o ápice de uma nova ordem mundial totalmente Totalitária que geraria opulência, e escassez.
A informação que dispensa profunda análise é a identificação de época em que ocorre a narrativa. Apesar do carácter futurista da obra, e curioso como o Tempo parece não transcorrer, e um modo estático. Esse lampejo de Orwell é interessante, pois sustenta a visão crítica contra os regimes Totalitários que são um regime de poder que causa retrocesso.
O mundo está em uma guerra persistente, que é sistematicamente programada pelo ditador, identificado como: Grande Irmão - representando e líder supremo - do partido político que governa um terço do território mundial. Além da guerra, todos os eventos são previsíveis e manipulados o Partido exerce pleno poder sobre as ações das pessoas, e essa falta de eventos genuínos e imprevisíveis causa a sensação de “estar preso no tempo” ou do tempo “estar parado”.
Como extensão do domínio do governo para monitorar as ações individuais o Grande Irmão instala teletelas; que são pequenas telas espalhadas pelos cantos da cidade, inclusive na casa dos cidadãos. Qualquer pessoa que fosse flagrada pela teletela agindo contra os princípios do governo era imediatamente detida pela polícia das ideias. Sendo assim, era comum que os cidadãos entregassem os membros do seu núcleo familiar.
E para o monitoramento de massa, o mecanismo utilizado é a sessão de cinco minutos de ódio, sessão que exibe todos os dias em vídeo um suposto rebelde do governo, que os cidadãos devem ridicularizá-lo.
Por meio dos controles de manipulação descritos, as atitudes espontâneas, inclusive o amor entre casal e família são inexistentes.
Embora o domínio do partido fosse soberano, geograficamente não representa nem metade do território mundial, que divide-se em quatro continentes: Oceania, Eastasia, Eurasia, e um pedaço de terra sem governo definido.
O ambiente de toda história é a Oceania, que leva esse nome porque é o continente que cobre três oceanos, corresponde o que seria as Américas, embora fique explícito que Oceania é uma metáfora de Londres.
Eastasia e Eurasia, aparecem como pano de fundo porque ambos vivem em guerra com a Oceania. O motivo da guerra e pelo território que não tem governo definido. A exploração por esse espaço é a causa do mundo viver em uma guerra persistente.
O personagem principal e Winston Smith. E um homem de meia-idade, branco, altura mediana, e fraco. Trabalha como funcionário do Miniver (no idioma Nova fala, o idioma oficial de Oceania), que significa Ministério da Verdade. Ele mora sozinho, nao tem mulher, filhos, ou família. A única coisa que faz e trabalhar exaustivamente, e participar das sessões obrigatórias do partido, mas tenta conciliar essas atividades com seus hobbys - pequenos atos de rebeldia, como escrever e gritar que odeia o Grande Irmão.
Smith sente-se sozinho, porque tem a percepção que é o único diferente. Ele tem senso crítico da realidade que vive, pelo simples fato de ter Memória! Como lembra-se da vida antes do domínio do partido, não consegue adaptar-se à nova realidade e acreditar que tudo melhorou. Apesar de todo domínio autoritário que mata o indivíduo (tanto no sentido real, quanto figurado), Smith alimenta uma ingênua Esperança que um dia encontrará um par, alguém para compartilhar das mesmas aflições, e quem sabe acabar com o regime.
Na Rede social de Smith existem apenas dois grupos: a família do prédio, e um colega de trabalho. Entretanto o elo que une Smith a esses grupos, é determinado pela convivência, não há afeto entre os membros da Rede e nem poderia porque seria visto como suspeitoso pelo partido.
O ator social que surge em resposta ao desejo de Smith e sem conexão com os outros atores e Julia. Com fisionomia agradável, e bem mais jovem, branca, tem corpo ágil e saudável, ela e não é considerada bonita para Smith, mas ele atrai-se por ela apesar das diferenças; sua rebeldia, inteligência e desejo do fim do regime são o elo que os une.
A narrativa centra-se na vida de Smith, e suas críticas sobre a realidade e o regime. Distante, o narrador dá voz aos pensamentos de Smith e descreve os fatos de maneira fidedigna. A narração apesar de descritiva, não significa ser imparcial e repleta de análises interessantes a respeito de Poder e Governabilidade, e frequente a troca-se de voz entre o Narrador e Smith.
Por meio da narrativa e os ideias descritos, somos levados a Esperança de Smith que se o povo unir-se poderá derrotar o regime, com a Memória de como a realidade era diferente, através de mudanças despretensiosas - chamada de forças invisíveis - encontra-se a chave para o enfrentamento e derrota do regime Totalitário. Smith está tão convicto dessa tese que creer que e preciso apenas encontrar outras pessoas, que compartem das mesmas angústias a fim de transformá-las em força e união contra o regime. O ideal de Esperança contrasta com o Monopólio do Grande Irmão.
1984 é uma obra antagônica pois contrasta o conceito Futurista que remete geralmente a otimismo e progresso, com o contexto real da obra de Pessimismo e Retrocesso.
A obra de Orwell abre à imaginação para replicar o enredo da obra em qualquer contexto. Pode não haver mais um líder autoritario, mas líderes autoritarios espalhados pelo mundo, e forças invisíveis que controlam e manipulam toda a iniciativa genuína, que matam o individuo e o ser social. A única esperança é recorrer a Memória para nao ser enganados por falsos profetas.