Dalmo 14/03/2021
A guerra que continua influenciando o mundo
A 1ª Guerra Mundial, ou Grande Guerra, foi o primeiro evento cataclísmico da humanidade no século XX, e o primeiro na história mundial em que a tecnologia e indústria entraram para valer no campo de batalha. "Rites of Spring" (ou "A Sagração da Primavera" no título em português) é um livro que trata daquela guerra não sob uma perspectiva estratégica-militar, mas cultural e transformacional de um mundo em ebulição - o surgimento da consciência moderna, mais especificamente sua obsessão com a emancipação e com a ruptura das tradições.
O título do livro foi adaptado de um ballet e musical russo, composto por Igor Stravinsky e coreografado por Vaslav Nijinsky, que estreou em maio de 1913 em Paris e foi considerado um marco do modernismo. Stravisnky o definia como uma representação da Rússia pagã unificada por uma única ideia: o mistério e o surgimento do poder criativo da primavera. Polêmico, o ballet foi, ao mesmo tempo, rejeitado e aclamado pelo público por onde foi apresentado. Cabe ressaltar, como destaca o autor do livro, que a arte, ou senso estético, coadunando com o questionamento dos valores morais e sociais na virada do século XIX para o XX, se transformou numa questão de extrema importância para o mundo ocidental. Ela era vista como o caminho que levaria à liberdade e, portanto, polemizar era o meio de exercer essa liberdade e romper com o passado.
Transcrevendo e citando várias cartas de soldados que lutaram no front, além de outros relatos, o livro também nos leva ao coração da guerra - sua carnificina, crueldade, insensatez e, ao mesmo tempo, um retrato das transformações em curso que seriam a argamassa para os novos conflitos que se seguiram. Para os soldados ingleses e franceses, em especial os primeiros, o que estava em jogo era a preservação da ordem nacional e internacional que estava sob ataque. Enquanto um lado defendia um legado, o outro (alemão) defendia uma visão de futuro.
Nunca, em nenhuma outra guerra, tinha havido tantas mortes em tão pouco tempo e em espaços geográficos tão reduzidos. Somente nas duas batalhas de Verdun e a do Somme, os alemães perderam 800 mil homens, um pouco menos que franceses e ingleses. O uso intenso e sistemático de artilharia, metralhadoras e gases mortais (o mostarda foi mais utilizado) dizimava milhares de soldados instantaneamente, transformando a paisagem dos lugares devastados em amontoados de crateras, lama e pedaços de corpos em decomposição. Além das armas, doenças causadas pelo tempo rigoroso, subnutrição e insalubridade das trincheiras, também eram a causa de muitas baixas nos dois lados do conflito.
Logo após a guerra o clima no Ocidente, em especial na Europa, era de melancolia e arrependimento, acompanhado por uma ansiedade e excitação trêmulas. A juventude ganhou força com a rejeição aos valores da geração anterior, que era representada principalmente pelo pais que haviam mandado seus filhos para a guerra. A crescente independência da mulher, beneficiada com a intensa participação feminina no esforço de guerra, significou o enfraquecimento da autoridade paternalista. Moral e sexo se transformaram mais e mais numa questão de consciência individual e menos numa questão de preceitos sociais.
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