Kamila 22/10/2017
O Ano em que Conheci Meus Pais conta a história de Jonas Damasceno, um jovem que está para se formar em jornalismo e que almeja seguir na carreira de correspondente de guerra. Lembrando que estamos na São Paulo de 1989 e o Brasil e o mundo fervilham de novidades, como a primeira eleição direta sendo realizada no país e o Rebelde Desconhecido tentando parar tanques de guerra em Pequim.
Porém, depois de ir até o Rio para assistir a uma palestra de um sobrevivente da ditadura, Jonas começa a duvidar de sua história. Isso porque ele foi criado pelos avós, depois que seus pais foram vítimas fatais de um acidente de carro, em 1970. Ele nasceu em Belém do Pará, mas desde os três anos mora com os avós. O tal palestrante, ao ouvir o nome completo do rapaz, lhe faz uma revelação interessante, que o faz colocar em xeque toda sua vida.
Ao confrontar a vó Veroca (apelido de Verônica) sobre a tal revelação, Jonas fica mais confuso ainda. Sua relação com o avô Odílio, um militar, nunca foi das melhores. E tanto esse fato como diversas situações de sua vida, fazem com que ele comece uma viagem no tempo. Antes de querer cobrir tragédias e conhecer histórias, ele precisará saber de sua própria história. Com a ajuda de Domenico, seu melhor amigo, Jonas parte numa viagem não só até Belém, mas também numa jornada para saber quem foram seus pais.
Primeiro recebido em parceria com a jovem Monomito Editorial, O Ano em que Conheci Meus Pais não conta só a história de Jonas, conta também um emblemático capítulo na história de nosso país. Os pais de Jonas eram comunistas, e todo mundo sabe que, durante o regime militar, isso era um crime. Em paralelo à história de nosso protagonista, também temos acesso a um certo diário, em que descobrimos como era a vida de um militante - particularmente, eu não teria coragem de ser militante, independente do lado que eu acredito.
O estreante Toni Moraes nos mostra como era Belém do Pará em 1989, um cenário muito interessante, com certeza muito diferente da cidade como é hoje. Nunca saí da região sudeste, mas ao ver as descrições (muito bem feitas) da cidade, me deu vontade de conhecê-la, mesmo sabendo que hoje está bem diferente. Inclusive, acredito que o autor tenha tido um trabalho e tanto pra pesquisar como era a cidade naquele tempo.
Precisamos falar sobre Domenico. O melhor amigo de Jonas é um artista plástico famoso, que chocava a população com suas obras, em que usava de tudo, até mesmo esperma (e os conservadores reclamando do pelado do museu...). Mas ele tinha uma grande tristeza: além de se sentir sozinho muitas vezes, ele descobriu ser soropositivo. Justamente na época em que a doença era vista como "coisa de viado", lembrando que o primeiro caso de AIDS no país foi em 1982. Diferente de hoje, onde o Brasil é referência no tratamento do vírus, naquele tempo, não tinha muitos recursos e quem tinha a doença morria cedo.
Mesmo sabendo que tinha pouco tempo, Domenico não hesitou em ajudar o amigo e lhe acompanhar numa cansativa viagem de carro até Belém. Munidos de um mapa e muita coragem, a dupla conseguiu levantar informações importantes, enquanto Jonas repensava sua própria vida, seu futuro, seu relacionamento com Renata... além, claro, de ter um choque de realidade. Por ter tido uma vida boa (bons colégios, tudo do bom e do melhor, formando da PUC, etc.), nunca lhe passou pela cabeça que poderia haver pessoas que ficavam à própria sorte, sendo esquecidas pelo governo (nada muito diferente de hoje).
Como sabem, sou formada em Jornalismo, então todo e qualquer livro que tenha um como protagonista de cara me encanta. E com Jonas não foi diferente. Sua sede de descobertas me fez lembrar como eu era quando comecei minha própria faculdade. Logo de cara sabemos que ele deseja ser correspondente de guerra e me identifiquei um pouco quando me lembrei que entrei na faculdade querendo ser correspondente internacional, mas o mundo girou e acabei me juntando a duas amigas para criar uma revista literária.
Jonas vai usar seus conhecimentos aprendidos na faculdade para obter respostas e foi muito bom acompanhá-lo nessa jornada, também investigando com ele, acertando algumas coisas, errando outras (sou péssima em pegar as coisas no ar). Obviamente, muita coisa é revelada, nos fazendo ter vários sentimentos em relação às personagens - quero deixar bem claro que odeio o Odílio.
Por fim, se esse livro virasse filme, daria um roteiro incrível, porque muitas das informações passadas são reais, então o leitor terá uma ótima aula de História do Brasil, ainda mais sobre um capítulo que ainda não está esclarecido às novas gerações. Sobre o trabalho da Monomito está incrível, é uma editora que veio para ficar, com uma edição impecável e o mais bacana é que a foto que está na capa é da família do autor, salvo engano, são os pais e do irmão de Toni, segundo ouvi de uma moça no dia em que fui à sessão de autógrafos.
Agradeço ao Toni e à Adriana Chaves, sua editora, por me permitirem ler essa história tão maravilhosa e desejo muito sucesso à Monomito, que seja a primeira de muitas publicações! Ah, e Toni, obrigada pelo autógrafo! E você pode garantir o seu na loja online da editora.
site: http://resenhaeoutrascoisas.blogspot.com.br/2017/10/resenha-o-ano-em-que-conheci-meus-pais.html