ElisaCazorla 22/12/2017
Silêncio, por favor!
Não gosto de livros policiais (este não é um) mas está na categoria talvez porque tenha um cadáver mutilado e um julgamento, mas não é um policial clássico. Enfim, decidi ler este livro por causa da pergunta que encontramos na capa: " Pode o ruído incessante produzido pela sociedade contemporânea provocar instintos homicidas num morador de uma grande cidade?" Eu queria muito saber qual era a resposta da autora.
(Spoiler alert) Gostei muito das ideias da autora sobre o silêncio ser um bem que só pode ser comprado pelo ricos mas acho que ela deveria elaborar mais o que silêncio significa e deveria levantar algumas questões sobre a possibilidade do silêncio nem mesmo existir. Será que o silêncio absoluto existe? Acho que não. Acho que viver é produzir sonos. Nosso corpo, o sangue que pulsa do coração e corre pelos tubos venosos direto para todos os órgãos fazem barulho. O coração é puro barulho. Sem falar da respiração! Barulho! Sentimos nossos barulhos internos. Ouvimos cada ruído de nosso corpo de dentro para fora. E nosso corpo sofre com os ruídos do ambiente e os sente de fora para dentro. Nosso ouvido é como uma concha acústica e reverbera o mais singelo e delicado som externo. Vivemos em uma constante 'rave' desde o momento que nosso ouvido é formado ainda dentro do útero de nossas mães. A autora não foi tão a fundo. Uma pena.
O narrador é o protagonista e está em primeira pessoa. Prefiro os narradores oniscientes mas gostei deste protagonista/narrador. Me senti próxima dele e já de cara senti também uma certa empatia pelo protagonista e me identifiquei com ele pois, assim como ele, sou constantemente atormentada pelos ruídos e barulhos da cidade - o trânsito ininterrupto, o tic tac do relógio de parede da cozinha, o constante zummmm, em uma nota só, da geladeira, as crianças no pátio do prédio, as risadas do vizinho, as mensagens do celular, o cantor desafinado, o sertanejo universitário - sim, isso é barulho e não música -, carros e motos que insistem em exibir seus poderes inúteis para todos e para ninguém, o lixeiro que parece nunca terminar de coletar as caçambas, o estalar da madeira do guarda roupa e do piso, ahhhh é muito barulho!!! Felizmente moro no último andar e não ouço passos ou descargas, mas ouço a caixa dágua no meio da noite. Detesto o barulho da caixa d´água. Agora com o verão aparecem novos ruídos: o ar condicionado dos vizinhos. Maldito verão! hehehehe
Algumas pessoas não entendem que não é chatice. Existem algumas pessoas mais sensíveis aos ruídos. O protagonista é uma dessas pessoas. E seu vizinho parece ser a fonte de todos os seus problemas.
A narrativa é fluida, o texto é fácil de seguir. O enredo não apresenta muitas novidades, mas algumas ideias interessantes sobre o silêncio e o barulho.
Faltaram algumas páginas. Acho que mais umas 50 ou 60 dariam conta de suprir minha necessidade de explorar mais as ideias da autora sobre o barulho e o silêncio, mas de modo geral eu gostei. Vale a pena a leitura. O desfecho fraco não elimina todos os outros pontos positivos da obra. Recomendo!