JohnnyCamilo 19/03/2023
Uma viagem complexa nas origens de um ganhador do Nobel
Após ler O General em Seu Labirinto e um pouco de Cem Anos de Solidão e me apaixonar pela narrativa de Garcia Marquez, resolvi parar a história de Macondo e ler cronologicamente as obras do autor.
Resenhar A Revoada (O Enterro do Diabo) é bem mais complicado do que resenhar outros livros.
Isso porque temos um fio condutor (o enterro do Doutor, personagem odiado pelo vilarejo de Macondo), organizado pelo Coronel (movido por uma obrigação), e acompanhado (a contragosto) por sua filha e seu neto.
O livro é sobre Macondo e seus moradores? É sobre as mudanças e revoluções que levaram a cidade da simplicidade ao auge e à decadência em menos de uma geração?
É sobre a hojarasca, a folharada, a revoada humana que chega, transforma, constrói, destrói e vai embora, deixando apenas escombros e memórias para aqueles que ficam?
Talvez seja sobre tudo isso. Talvez seja tudo para além disso.
Talvez seja uma história sobre solidão e melancolia (temas recorrentes nas obras do autor). Mas também seja o conflito entre um niilismo pragmático e quase sociopata contra a fé: fé esta que mesmo desgastada age como fio condutor moral daquilo que é "certo", e aparece na forma de um dever a ser cumprido. E todos esses conflitos e sentimentos são mostrados de forma fragmentada na visão de cada um dos três personagens em destaque.
E acredito que justamente por isso A Revoada tenha uma avaliação média abaixo do que se espera do autor nesta rede social. Apesar se ser um livro curto, sua linguagem por vezes é metafórica demais, e longas frases com adjetivos pouco comuns podem interferir na naturalidade do fluxo da leitura.
Além disso a narrativa fragmentada deixa a história picada, cheia de indas e vindas com diferentes pontos de vista, e nada realmente é explicado ou introduzido. É como se o leitor realmente acompanhasse os pensamentos dos personagens in natura, sem aquela explicação mais profunda que faz sentido apenas para o leitor, e não ao personagem em si.
Mas mesmo com esses pontos a serem considerados, é inegável que a literatura de Gabriel Garcia Marquez está ali. Seu "escrever", seu estilo e sua sensibilidade característica se derramam a cada página, deixando bem claro para nós, que no presente já sabemos de toda sua obra, que o caminho para a ascenção de um dos maiores autores latinoamericanos já estava sendo solidamente pavimentado em seu primeiro livro.