srpuer 28/04/2024
“Fim de festa”, de Renata Wolff, é uma coletânea de 22 contos cujo teor pode ser determinado pela epígrafe de um trecho de F. Scott Fitzgerald em O grande Gatsby: “Aquelas festas resplandecentes e inebriantes ainda permaneciam comigo tão vividamente que eu chegava a ouvir música e risadas de seu jardim, desvanecidas e incessantes; e era como se visse os automóveis indo e vindo pela entrada da casa. Certa noite, ouvi um carro de verdade (...) Provavelmente era um derradeiro conviva que estivera viajando pelos confins do mundo e não sabia que a festa havia acabado”. Os textos todos são eivados dessa melancolia residual de alegria intensa, incômoda e que se reflete não só no cenário de um fim de uma festa, mas no começo de um relacionamento, no meio, nas consequências de um sonho, nas expectativas colocadas e imagens criadas do outro.
Passar por esse livro foi uma experiência peculiar. Comprei-o há alguns anos em uma promoção na falecida Saraiva e sempre que tentava começar a leitura, não passava da primeira página. Os primeiros diálogos não cativavam, a linguagem era artificial, a situação parecia clichê. Depois do primeiro conto (talvez eu não tenha entendido direito), a coisa engatou legal. E assim se seguiu até acabar o livro. Contudo, são os contos de abertura e de encerramento os mais desconexos, faltosos de uma atmosfera própria, um universo convincente e atraente. À exceção desses, o caminho de leitura é um vai-e-vem de emoções, piedades, amores, decepções, choques e contentamento.
Pode-se perceber dois(?) núcleos narrativos que perpassam os contos e que se atravessam todos entre si. O primeiro se encontra na sequência dos contos Buquê (p. 15-21), Máscaras (p. 41-45), Tradução simultânea (p. 59-63), Paris (p. 79-83) e Flash mob (p. 107-110); o segundo, em Madrugada (p. 33-36), Névoa (p. 73-77), Turismo (p. 97-101), e Fim de festa (p. 133-139). Além desses, destaco contos “independentes” (todos podem ser lidos independentemente) que merecem leitu-ra de todo mundo: Sintonia (p. 65-71), Roda-gigante (p. 85-95), Navegantes (p. 111-126) e Fábula (p. 141-151). Esses quatro tratam, com linguagens diferentes e necessárias, de temas complexos e relacionamentos idem, como todo o livro, mas têm uma força e uma pungência de causar arrepios e reflexões desconcertantes, ainda mais em tempos atuais.
Se o começo foi desafiador e excessivamente procrastinado, senti-me recompensado depois de insistir e finalizar a leitura. Uma pena que demorei tanto tempo para passar de um texto que me conduziria a outros 21 que leria em um dia.