HigorM 11/01/2024
"LENDO PULITZER": sobre quando não é preciso ser mirabolante, revolucionário ou inovador para ser eficiente
Pode ser apenas uma conclusão minha, obviamente, mas a impressão que William Maxwell me passou com este "Até mais, vejo você amanhã", foi é a de que ele quis apenas escrever uma história das mais simples, colocar no papel um recorte de sua infância ou até mesmo uma ideia que teve, sem que ela fosse revolucionária ou figurasse em importantes prêmios, como foi, de fato, ao figurar na lista de finalistas do Pulitzer de 1981 e marcar presença em outros 5 prêmios estadunidenses.
Talvez eu tenha sentido isso por pesquisar sua biografia e ver que, apesar de escritor de renome, Maxwell fez mais sucesso ao trabalhar por 39 anos à frente da seção de ficção da The New Yorker, sendo o responsável por publicar textos - com bastante rigor, relatam - de Vladimir Nabokov, John Updike, Salinger, John Cheever, Eudora Welty, Shirley Hazzard, Isaac Bashevis Singer, dentre outros nomes de peso. Ao se deparar com tais escritos, e colocar o de Maxwell lado a lado, o que se tem é uma prosa tão simples, tão básica, mas que, ainda assim, e justamente por isso, se sobressai à sua maneira, e ganha seu lugar ao sol.
Crua, limpa e objetiva, a narração de Maxwell nos apresenta sem rodeios, ao longo das pouco mais de 150 páginas, tanto a união, quanto a ruína da amizade de dois vizinhos: os Wilson e os Smith. Tudo ia bem entre eles, suas esposas e filhos, até que um caso extraconjugal culmina na morte de um deles. Não é spoiler a morte, já abordada na primeira página, nem quem causou tal delito, pois o que o livro quer mostrar é o porquê.
Então, o narrador, uma criança amiga de Cletus, filho de Smith, pretende voltar ao passado depois de 50 anos de silêncio e desconforto, para entender exatamente o que aconteceu quando criança, o resultado de tal assassinato na vida do amigo, na sua própria vida e na comunidade como um todo, afinal, a pequena Lincoln, como toda boa cidade interiorana, sabe de tudo e de todos, e tal crime parecia ter sido profetizado por todos, mesmo não evitado, assim como em "Crônica de uma morte anunciada", de Gabriel Garcia Márquez.
A escrita de William Maxwell é o grande diferencial de "Até mais, vejo você amanhã", pois não possui um estilo moderno, inovador ou que poderia torná-lo mais culto, erudito e inacessível; pelo contrário, é tão cristalino, tão limpo, que o leitor não precisa de muito esforço para passar as páginas. A eficiência com a simplicidade da escrita é tão nítida, que mesmo sabendo quem matou e quem morreu, o leitor fica aflito ao entender as motivações que levaram ao crime, e conforme as páginas vão se esgotando, a angústia se faz presente ao ter de reviver o que já foi relatado na primeira página, o crime, embora agora com mais detalhes e as justificativas entendidas.
Tudo é muito sublime, bem cuidado e elaborado: a amizade tímida, porém genuína, de Cletus e do protagonista, que dá origem ao lindo título, dos amigos que, diariamente se cumprimentam a final de um dia de brincadeiras, na certeza de se reencontraram no dia seguinte, até que o elo é interrompido; a narrativa que, em determinado ponto, dá atenção ao que uma cadela sente em relação ao comportamento dos humanos que a rodeiam e ao que estão fazendo, totalmente diferente de sua rotina de bicho de estimação; a frustração de um matrimônio fadado ao fracasso, mas estruturado em pilares machistas, opressores e violentos dos anos 1920…
Enfim, "Até mais, vejo você amanhã" nada tem de original, afinal, tais enredos são facilmente encontrados em quaisquer outros livros, mas ainda assim, é preciso ter tal livro em mãos para entender sua força e encanto em meio a uma tragédia familiar tão assoladora, e como, mesmo podendo ser apenas mais um, ele consegue se destacar.
Este livro faz parte do projeto "Lendo Pulitzer".