Diego Rodrigues 30/09/2021
Muita sensibilidade em um século de história
Gilbert Hernandez (Beto, para os mais chegados) é um cartunista norte-americano, nascido em 1957, na cidade de Oxnard, Califórnia. Ao lado dos irmãos Jaime e Mario criou a multipremiada série "Love and Rockets", que revolucionou a cena dos quadrinhos underground nos anos 80. Esquetes de "O Dia de Julio" já haviam figurado na série, entre 2001 e 2007, o material foi então reunido, retocado e lançado neste único volume, em 2013, e trazido ao Brasil pela editora Nemo.
"O Dia de Julio" narra um século de uma vida humana (no caso, do Julio, obviamente), mas não só isso: narra também a história de sua família através de gerações e, mais ainda, um século da história da humanidade. Aqui os grandes eventos históricos caminham lado a lado com os dramas pessoais: se temos guerras, mudanças climáticas, surgimento de doenças e movimentos sociais, também temos dramas familiares, luto, loucura e sexualidade.
A arte é simples, mas a narrativa de Beto é de uma sensibilidade ímpar. Além de tocar em temas mais delicados e que são inerentes à condição humana, o autor também trata com extrema sutileza da passagem do tempo. Apesar de acompanhar Julio e sua família durante um século, em nenhum momento da narrativa o leitor é informado em que ano a história se encontra, está tudo nos detalhes: rugas que surgem conforme os personagens envelhecem, mudanças no modo de se vestir, o surgimento de fábricas e automóveis, a migração do campo para a cidade e, claro, os eventos históricos. Tudo isso torna a narrativa leve e sutil, mas exige atenção do leitor para "preencher os espaços em branco". É um quadrinho que deixa muita coisa não dita e algumas interpretações ficam a cargo do leitor.
Não tem como não se lembrar da obra máxima do escritor colombiano Gabriel Garcia Márquez, "Cem Anos de Solidão", há até quem acuse Beto de plágio, mas vejo mais como uma inspiração. Apesar de ter lá suas semelhanças, "O Dia de Julio" explora outros caminhos e tem a sua própria trama. Uma história sensível, tocante e que nos faz refletir sobre o tempo que passamos aqui. Acho que acertei na escolha para voltar a ler quadrinhos.
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