spoiler visualizarLali Jean 30/01/2022
Limites do amor, arte e ficção no mundo fascista do séc XXI
Ler autoras contemporâneas contando histórias na fronteira da auto-ficção é o que tenho feito por lazer entre uma literatura densa e outra. Gamei na Sally Rooney, na Rachel Cusk e já em 2022, vocês viram por aqui que li e apreciei a Elif Batuman com sua A Idiota.
Há algo confortável em ter esses trinta anos e certo gosto pela cultura pop e saber de histórias de mulheres que vão à universidade, que leram e se encantaram pelos mesmos textos acadêmicos que eu, mulheres que andam às voltas de se entenderem escritoras ou artistas (ou não). Além disso, todas muito desencantadas com o mundo como está. Política, desejo, envelhecimento.
Nessa novela, a autora toma emprestado uma personagem real, a artista Kathy Archer para nos confrontar sobre se é possível amar em tempos abomináveis como os que vivemos. Acompanhamos as reflexões e preparativos da personagem ao se casar em algumas semanas/meses do ano de 2017. O texto é recortado por tweets de Trump, as notícias que ilustram a consumação do Brexit, os crimes de Charlottesville, outros acontecimentos de 2017 e uma ambientação em certa cena artística e cultura pop. Foi acalentador saber da mente atormentada de uma mulher de 40 anos desesperada com um mundo fascista e cotidiano e paranoica sobre sua escolha em ser a esposa de alguém. É também um livro sobre amor. (O fato de ser um casamento aberto é algo que me prendeu até o fim do livro, porque jamais falamos com naturalidade e curiosidade desse elefante na sala das redes sociais, só votamos sim ou não, feito no brexit. A autora coloca o tema de modo suave, cotidiano)
Crudo encontrei nessa busca por autoras contemporâneas, para me distrair e me identificar. Olivia Laing é conhecida como crítica de arte e escritora não ficcional. Aliás, uma das partes mais envolventes do livro tem a ver com os quase-ensaios que a personagem principal nos presenteia no fluxo de consciência que atravessa o texto. Essa característica é comum e algo que gosto muito nos livros que mencionei acima.
Comecei a ler esse livro três vezes, na terceira ainda reli boa parte. Tive dificuldades com a estrutura narrativa que vai nos contando aos poucos e que precisa da persistência da leitora que não conhecia quase nada das referências artísticas, sequer a protagonista.
Tive dificuldades com a leitura em inglês, um vocabulário muito variado. Um uso muito diverso da língua, dá inveja de alguém conhecer assim seu idioma. Por fim, ressalto que a protagonista traz reflexões sobre amor, família e desespero com o fascismo e o terror de continuar vivendo a vida com as quais me emocionei muitíssimo.