caue 29/09/2024
A constelação e os mapas
Nós somos como mapas: territórios delimitados por linhas esticados sobre um papel. E a nossa geografia é toda sobre qual é o exato limite entre nós e os outros. Eu penso que os primeiros "encontros" territoriais são com aqueles a quem chamamos "família".
Lançados no mundo em conjunto a elas, pressupomos que tais pessoas são as mais conhecidas por nós. E o mistério, então, é viver o resto da vida lidando com os outros e não com elas. Afinal, toda mãe pensa conhecer a exata natureza de seus filhos. Todo marido está certo do coração de sua mulher. Todos que moram embaixo do mesmo teto acreditam que sua conexão prevalecerá pelo puro e simples prévio conhecimento recíproco.
"Familiar" não significa "algo a que se estabelece com habitualidade e intimidade. Que já foi visto ou conhecido antes" à toa.
No final da década de 70, o psicanalista alemão Bert Hellinger, junto de sua esposa, criou um conjunto de técnicas para auxiliar o tratamento de questões de saúde mental através da compreensão e da abordagem daquilo sob qual todos os seres humanos se fundam, segundo sua teoria: as relações familiares. Criou-se a Constelação Familiar, uma técnica muito utilizada até hoje.
Pontuadas essas concepções, pontuo também que essa compreensão do ser através do relacionamento que tem com seus pares parece ser o foco principal da Clarice nessa obra. E a cada conto, cada linha e parágrafo lidos, eu refletia sobre como essa viagem de impressões e de experiências sobre o retorno àquilo que você conhece é constantemente quebrado pelas epifanias, os choques e solavancos das descobertas e, principalmente, da contemplação, este que julgo ser o momento de quebra e separação do homem com o outro, para abraçar consigo o seu universo individual. Clarice parece compreender por demais tudo isso, ou se não compreende parece investigá-lo muito bem.
Quero destacar "A imitação da rosa", que foi provavelmente o mais próximo que eu cheguei de uma erupção, por falta de uma outra expressão que descreva o que senti. Bom, não há outra conclusão, ou um ponto específico a que chegue essa resenha. Ler Clarice é mascar um chiclete que nunca perde gosto: uma simples experiência que nos leva ao imortal e infinito.