antuan_reloaded 19/05/2024
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Em "Laços de Família", Clarice Lispector explora a náusea existencial, por meio da qual as protagonistas de seus contos são frequentemente confrontadas com uma realidade que as desestabiliza e as tira de seu eixo habitual. Cada conto do livro insere os seus personagens em situações cotidianas que não surgem de grandes acontecimentos, mas de interações banais e rotineiras. O ambiente público e urbano, fora de casa, desempenha um papel crucial para esses acontecimentos, ficando o apartamento e os jantares noturnos como resquícios da vida privada e doméstica. Clarice coloca suas personagens em bondes, ônibus, ruas movimentadas, trilhos, restaurantes e parques. A urbanidade moderna serve como um espelho das ansiedades internas das protagonistas, refletindo a confusão e a desordem de suas vidas interiores. Ana, de "Amor", é, sem dúvida, uma das minhas personagens favoritas de todos os tempos e esse conto é um exemplo perfeito do que há de melhor na prosa moderna brasileira. Vale pontuar, ainda, que as tardes, em particular, são momentos significativos na obra de Clarice, pois é durante essas horas de transição entre o dia e a noite que os personagens frequentemente experimentam epifanias perturbadoras. A luz suave, a falta do que fazer durante esses momentos e a calmaria aparente das tardes contrastam com a turbulência emocional que emerge nas narrativas, realçando a tensão entre a superfície calma da vida cotidiana e o tumulto interno dos indivíduos. Com isso, o simples ato de viver se transforma em um desafio constante, já que o familiar se torna estranho e o ordinário se torna extraordinário.