A Inveja dos Anjos

A Inveja dos Anjos C. Stephen Jaeger




Resenhas - A Inveja dos Anjos


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Codinome 10/01/2021

Um pouco sobre "A inveja dos anjos"
O que primeiro chama a atenção nesse livro já é seu título: “A inveja dos anjos”, pelo menos, chamou a minha. Mas logo no início, vemos o porquê dessa expressão através da citação da carta à virgem Sofia, de Bernardo de Claraval: basicamente a riqueza humana pode chegar a ápices tão altos, através de uma educação moral, espiritual e corporal, que até os anjos poderiam invejar, pelo fato de não conseguirem transmitir as virtudes internas para o lado externo, pois são incorpóreos.

O livro tem uma preocupação histórica em esmiuçar a educação e os ideais sociais, na Europa medieval, entre 950-1200: existem poucos documentos textuais vinculados as escolas catedrais, dos séculos X e parte do XI, o que tornou, provavelmente, o trabalho do historiador C. Stephen Jaeger mais desafiador. Isso muito se dá pela cultura carismática da época, em que o valor maior encontrava-se na pessoa física (isso é o cerne do carisma, aliás, Bernardo de Claraval, na visão de Jaeger, é o único indivíduo que conseguiu trazer o carisma tão real e tão presencial em textos, o que ele chama de “textos carismáticos”, fiquei curiosíssimo em ler), naquele lugar e naquele momento, e qualquer documentação textual ou escrita não teriam a mesma magnitude para apresentar as grandes personalidades (uma cultura “educacional” que vai mudando, do século XI para o XII). Aliás, é no século XII que se insere a grande produção material e textual, no entanto, muito mais como uma resposta ao imaterial do século XI: principal período de produção de uma cultura carismática de moral, conduta, postura e virtudes. Na visão do autor (e também na minha), o real sobrepuja o textual e a imagem que se cria: Jaeger explica tudo isso de uma forma muito mais elaborada, bem mais original e mais elucidativa do que eu escrevendo aqui. Um pouco das excelentes palavras do historiador: "O livro-texto é bom, mas não se compara à presença de um ser humano, seja ela real ou relembrada, em termos de impacto imediato". Para ter uma noção melhor justamente sobre isso, recomendo a leitura de “Cultura carismática”, poucas páginas encontradas logo na introdução.

Ao início, temos um panorama da educação carolíngia (século VIII), um período que está fora do enfoque principal do livro, mas que foi importante, pois nele que ocorreu a revolução educacional, dividindo-se nas catedrais, monastérios e corte. O período seguinte foi o do império otoniano e as escolas catedrais começam a assumir fortes intersecções com o poder político da época (império). Importantes mestres e grandes mentes se formam nessas escolas catedrais. O autor aborda cada uma delas, situadas na Alemanha e na França: Colônia, Liège, Rheims e por aí vai...

Ao longo da parte subsequente, compreendemos o âmago dessas escolas: o cultivo da virtude (do latim, "cultus virtutum") e sua ética moldando as artes liberais (muito interessante ver como essa prática escolar era feita e como podemos aproveitar esse modo de pensar e fazer educação para os dias de hoje, em que a própria ideia de moral não é mais central e, ainda pior, se perdeu nos tecnicismos da estrutura curricular atual). Uma formação moral importante não apenas pensando no ser humano em geral, mas sabendo que os alunos iriam se tornar futuros administradores, políticos, clérigos e bispos. E se a formação ética e moral para um “afegão médio” já é importante, imagine então para futuras personalidades com tanto poder e influência.

A parte II trata da decadência da educação antiga devido a crises que começam a aparecer. Por exemplo, o caso em que o bispo Wazo assume a diocese de Liège, que gerou um mal-estar entre os bispos e clérigos vinculados ao rei, pois Wazo teve uma vida dentro do universo monástico e sem passar pelo ambiente e pela vida mais ativa na corte. De fato, com ele assumindo Liège, ocorre o início da separação da escola catedral com a corte. Outro ponto de ruptura foi a transferência de hábitos corteses para a diocese e que gerou divisões entre os clérigos, em questões como vestes (parte do clero defendendo algo mais simples e outra parte, algo mais ostensivo) e um aumento de frouxidão disciplinar, esse segundo mais perigoso, pois afetava a própria postura dos indivíduos. Vale lembrar que isso aconteceu juntamente com parte do auge das escolas catedrais, digo isso para evitarmos aquele erro de interpretar os fatos da história como algo que acontece exata e invariavelmente um seguido do outro.

Além disso, começam a se combinar iniciativas de alguns professores com confrontos diretos entre professor e aluno (casos como Pedro Abelardo versus Anselmo de Laon, no Concílio de Soissons). Em um primeiro olhar, parece que esse confronto seria benéfico para a ampliação do conhecimento. No entanto, acabam sendo sementes para uma quebra cada vez maior da autoridade dos mestres, autoridade que, nesse ponto de vista, fica abaixo da razão dialética. Caso já tenha lido “A formação da personalidade”, do Pe. Leonel Franca, saberá que o princípio de qualquer educação vem do centro moral de sua pedagogia. Querer bater de frente com esse núcleo duro (principalmente quando o seu adversário é o próprio mestre), te deixaria mais próximo a um cético subversivo do que a um verdadeiro formador, que tem como premissa respeitar esses princípios.

Perto do fim do livro, temos um foco na sociedade cortês e as diversas influências que ela tem do “cultus virtutum”. Um exemplo é a força do arcebispo Thomas Becket na alta corte inglesa, de Henrique II, seguindo o ponto central da riqueza moral e cultural do século anterior (século XI), que Bernardo de Claraval nos lembra tão bem (em relação às personalidades vivas): “A mera visão da sua figura é instrutiva; o mero soar da sua voz, um ensinamento.”

Enfim, temos em mãos um livro bem denso de 600 páginas (sendo um terço dele com notas, apêndices e referências, o que alivia esse número), demorei bastante tempo para ler devido essa densidade: bastante informação, muitos termos latinos específicos da época são usados e documentos com os trechos originais, e que exige do leitor uma leitura calma, buscando o aprendizado e a apreciação da excelente escrita do historiador C. Stephen Jaeger.
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Fabio 31/07/2020

Um ótimo livro cuja opinião deste leitor todo docente deveria ler. Um convite à reflexão da postura de professores e alunos, respeitando a cronologia e assim evitando-se riscos anacrônicos.
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