Rodrigo C. 26/03/2019
"Quem está por trás da escuridão dos olhos fechados?"
Em sua autobiografia, Paramahansa Yogananda detalha desde sua exasperante busca por um guru (para desassossego de seu pai e irmãos mais velhos) até seu último evento público, no dia 7 de março de 1952, num jantar em homenagem à visita do embaixador indiano nos Estados Unidos a Los Angeles (este último capítulo, lógico, escrito por seus seguidores da Self-Realization Fellowship). Entre ambos, temos o processo de transformação do jovem Mukunda Lal Ghosh no ser iluminado predestinado a unir o Ocidente ao Oriente através da divulgação da técnica da Kriya Yoga.
Nascido em 1893 numa numerosa família de casta alta, Mukunda era uma criança como cada um de nós. A diferença é que, desde sua infância, após a perda da mãe, aos oito anos, e sua "milagrosa" cura do cólera, ele partiu para sua peregrinação (interna e externa) em busca da espiritualidade.
Aos quinze anos, já tendo fugido mais de uma vez de casa, Mukunda ingressa na antiga ordem monástica dos Swamis após entrar em acordo com seu pai de, pelo menos, terminar o colegial (e não, ele nunca foi um aluno exemplar; suas notas não nunca foram as melhores, pelo contrário, sempre era aprovado pelo mínimo necessário). Sob a orientação de Sri Yukteswar, é rebatizado como Yogananda (Yoga, união divina, [através da] nanda, bem-aventurança). Aos 42, após ser obrigado por seu guru espiritual a cursar uma faculdade (onde, novamente, foi aprovado pelo mínimo necessário) e passar 15 anos divulgando a Kriya Yoga nos EUA, volta uma única vez para a Índia, em 1935, quando é agraciado com o título religioso mais elevado da Ordem dos Swamis, o de Paramahansa (parama, supremo, hansa, cisne; simbolizando o animal sagrado que serve de veículo a Brahma, o criador do Universo).
Muito além de uma simples descrição de passagens de sua vida, Paramahansa Yogananda indica caminhos que qualquer um é capaz de trilhar, desde que se decida percorrê-los. De iogues que materializavam perfumes e objetos àqueles capazes de não dormir e de se alimentar de luz, a riqueza de experiências que Yogananda narra minuciosamente em Autobiografia de um Iogue é para quebrar a desconfiança do materialista mais cético.
Mesmo indicando possíveis caminhos, em nenhum momento Yogananda sugere um específico. Ele deixa a escolha para o julgamento do leitor e fornece o seu apenas como exemplo inspirador. A técnica da Kriya Yoga, que ele expõe superficialmente em somente um dos mais de 50 capítulos não é tratada como o caminho definitivo (é, apenas, um atalho).
Numa obra tão ampla de significados, a principal lição que eu tiro de Autobiografia de um Iogue é que, acima de tudo, uma vez que o peregrino se coloca à disposição de sua fé e se movimenta (para dentro e para fora), ele será recompensado. "Caminhar", nesse sentido, pode se expressar de inúmeras maneiras: ver uma palestra, participar de um curso, ir ao encontro de pessoas e ouvir suas experiências de vida, ler um livro...
Exatamente como eu fiz ao adquirir esse livro após ouvir o nome de Yogananda pela primeira vez durante uma palestra. Fiquei curioso com a citação que abre essa resenha. Foi para descobrir o que há por trás dos meus olhos fechados que iniciei o movimento. No início, confesso, com uma certa resistência. Porém, após mais de 500 páginas, posso assegurar que não sou o mesmo que iniciou a leitura do livro. Não consigo (ainda) levitar ou materializar objetos, mas eu acredito piamente que há pessoas nessa realidade capazes, inclusive, de não morrerem.
A riqueza de sua vida (e, por consequência, de sua autobiografia) não foi o que Yogananda alcançou, mas as trocas obtidas nos encontros que teve com diversas pessoas santas ao longo de sua vida, onde ensinou e, principalmente, aprendeu. É a velha história: esqueça a iluminação!, apenas caminhe e esteja atento com o que acontece ao seu redor. A iluminação deve ser encarada como consequência e não como objetivo (em outras palavras: se jogue! E não condicione seus movimentos; quando for a hora, a iluminação chegará e se você estiver tão preocupado(a) em persegui-la, não terá aproveitado nada do percurso).
Outra lição que tiro do livro é a consolidação da ideia que o mundo externo é um reflexo de nosso interior e, nesse sentido, devemos sempre observar a lição existente por trás de cada acontecimento em nossas vidas e por trás de cada palavra de nossos interlocutores. Eles não estão ali para nos confrontar, mas para chamar nossas atenções para o que realmente importa.
Há dois Autobiografia de um Iogue publicados no Brasil. A versão da Lotus Editora contém a mesma biografia escrita por Yogananda em 1946. A outra, da Self-Realization Fellowship, instituição fundada por Yogananda para a manutenção de seu legado, contém, além da biografia original, enxertos com novas narrativas e notas de rodapé. Foi a que eu adquiri e recomendo.
Para finalizar, fica como exemplo principal a autenticidade de cada palavra, ato e experiência feitos incondicionalmente pelo autor que em nenhum momento demonstrou ser diferente de qualquer outro ser humano e que não teve nada além de abundância em sua vida. O tipo de abundância que almejo para minha.
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