Wellington 03/01/2022
O Caso Tuláiev – 9,0
Victor Serge é o primeiro autor que vejo escrever de forma... Temporalizada. Parágrafos gigantescos, às vezes se estendendo por duas, três páginas. Falamos do presente, mas agora retomamos memórias. É a vez do futuro. Esse aqui será fuzilado; aquela ali, presa. Quando criança, ela gostava de brincar nos jardins. Passamos pelo banco onde um mendigo dorme, logo será chamado para uma excursão ao interior. Pensamentos e descrições se misturam de forma natural, como se a vivência fosse sonho. A sensação onírica perdurou por todo o romance... E de forma muito pesada. A sensação foi curiosa. Gosto de sonhar; gostei de lê-lo.
O ambiente é a União Soviética nos anos de ferro, quando o governo Stálin aprisionou, torturou e matou milhões de pessoas, deixando outras passando fome. Trata do assassinato de um membro importante do Partido Comunista, responsável por expurgos e perseguições... Mas seu assassino não é ninguém. Diferente do Raskólnikov de Dostoiévski, ou dos culpados em Irmãos Karamázov, quem mata Tuláiev não planeja nada. É um cidadão qualquer, uma pessoa qualquer, que se vê frente a um monstro e o abate. Simples assim. Além das implicações morais, a trama acompanha como o regime totalitário reagiu; também trata da tentativa da revolução espanhola, da vida de vários personagens. O autor nega na primeira página, mas sua obra tem ares históricos.
Odiado pela direita e pela esquerda, ora amigo de Trótski e ora expulso por ele, uma vez comunista e outra anarquista, Victor Serge morreu no banco traseiro de um táxi mexicano. Expatriado desde que nasceu, morou em vários países, falava cinco idiomas, participou de reuniões clandestinas. Foi um revolucionário de carteirinha, fato inseparável de suas obras.
Mais um privilégio que a Carambaia nos dá de conhecer alguém oculto. Por que não ouvimos falar mais de Victor Serge?
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