Gandolfi 26/04/2021
Os Últimos Cantos não tão originais explorados por Gonçalves Dias
"Não chores, meu filho;
Não chores, que a vida
É luta renhida:
Viver é lutar.
A vida é combate,
Que os fracos abate,
Que os fortes, os bravos
Só pode exaltar"
Sou suspeito de fazer uma resenha desse Últimos Cantos do nosso consagrado Gonçalves Dias visto que fui impelido de ler o livro por conta do vestibular (o que aí já temos uma interferência problemática na leitura da obra) e por não ter lido os Primeiros e Segundos Cantos. Com isso, talvez depois de uma releitura livre e espontânea e dar uma conferida nos dois primeiros volumes, quem sabe minha visão sobre a obra possa a vir mudar, mas por enquanto, é o que temos por hoje.
Dividido em três segmentos diferentes, Gonçalves Dias usa esse final de trilogia para demarcar sua apreciação pelo Romantismo vigente na literatura brasileira na segunda metade do século XIX. E no primeiro segmento, Poesias Americanas, o autor faz isso muito bem!
Aliando o Romantismo com uma estética nacionalista e indianista, em que o índio é colocado como uma figura do herói nacional ao mesmo tempo em que valoriza as paisagens naturais tupiniquins, o poetisa consegue criar passagens que mais se aproximam da realidade brasileira, mesmo mantendo os padrões estéticos e formais europeus. Não chega a ser uma retratação fidedigna, coisa que veríamos apenas posteriormente com o Realismo e o Modernismo, mas já surge desde daqui essa preocupação com a representação nacional.
Obviamente, o poema que mais bebe dessa fonte primordial é o já tão conhecido "I-Juca Pirama". E não sendo por menos. Cativando com seus versos curtos e longos, em uma métrica idealizada para representar o conto de um jovem índio tupi, Juca-Pirama conquista por seus cantos que denotam temas como a coragem, a tradição e a cultura. Considerado por alguns, a obra-prima do autor, realmente, faz jus ao título.
Dentre as Poesias Americanas que temos a destacar podemos incluir também "Gigante de Pedra", "Marabá" e "A Mãe D'Água". Por si só, se o livro acabasse aqui ou os poemas continuassem nesse estilo, teríamos realmente uma obra espetacular de quebrar paradigmas. No entanto, nos segmentos seguintes, Poesias Diversas e Hinos, Gonçalves Dias cai no lugar comum, na presunção. Por mais que alguns deles ainda carecem de atenção como "Olhos Verdes" e "A Tempestade" (essa segunda com uma escolha de métrica ótima), os poemas não atingem o brilhantismo e a originalidade da primeira parte.
No terceiro segmento, dos Hinos, em especial, há uma falha que prejudica a obra como um todo que é a inserção de trechos em outros idiomas de autores estrangeiros como Shakespeare. Além de destoar do tom nacionalista que tanto a obra se destaca, as inserções de trechos e prefácios estrangeiros não é nada orgânica como os vocábulos ameríndios que são vistos por exemplo em "Marabá" e "Juca-Pirama". É perceptível que se trata apenas de um bel prazer do autor, que não tem a mesma organicidade que Guimarães Rosa, grande linguista brasileiro, faria anos mais tarde em suas obras.
"Últimos Cantos" se encerra assim com uma visão bem mediana em meus próprios termos. Sobre a edição em si, a Editora Martin Claret está de parabéns, além do trabalho físico do livro estar muito bom, a obra é precedida por uma explicação da vida do autor e da estrutura dos poemas que compõem o exemplar. No final há ainda um guia de leitura e questões de vestibulares, então vale a pena adquirir uma cópia.
Algum dia, ainda hei de vir Primeiros e Segundos Cantos!!