Ao mostrar o desenvolvimento do jovem Jaromil, feito poeta por sua mãe dominadora, o autor questiona a poesia como elemento que reproduz e depura sentimentos e fatos reais. este romance, pouco importa se o cenário de fundo é a antiga Tchecoeslováquia ou qualquer outro ponto geográfico.
O autor nos remete a um espaço-tempo metafísico e nos provoca sentimentos que vão da repulsa ao lirismo.
Valendo-se do romantismo moderno, Milan Kundera, sustentado por uma solaridade narrativa, apresenta-nos o poeta Jaromil que pode ser a síntese do lirismo e do niilismo ocidental à sombra do regime comunista.
Jaromil é a personificação da angústia, do inconformismo, da eterna busca (típica dos estetas) pelo belo e a encarnação do mito grego edipiano. O relacionamento do poeta com sua mãe beira a dependência patológica.
Poucas vezes um livro foi capaz de abordar a dor e a delícia do fazer poético com tal profundidade e leveza, resultando num amálgama filosófico-existencial. Além do que, romances sobre poesia costumam esbanjar pieguice e linguagem estereotipada.
Definitivamente, A vida está em outro lugar não é um romance para adolescentes que flertam com o colorido da ingenuidade. A história do poeta Jaromil foi arquitetada para nos amadurecer, enquanto nos revela um escriba tocado pela experiência de ser e estar no mundo com um pé na sua época e outro na elasticidade do pensamento humano.
É um fato que o livro citado não é o trabalho mais famoso de Milan Kundera, mas, certamente, é o mais questionador.
O personagem, a exemplo das criações shakesperianas, rapidamente cria uma identidade no leitor, despertando com facilidade sensações de raiva, empatia, pena e até indiferença.
Jaromil é nosso arquétipo para estudos freudianos numa sociedade em que ainda prevaleciam convicções político-partidárias e a criação literária costumava receber o carimbo de subversiva ? bons motivos para a procura por uma sublimação, ainda que ela estivesse em outro lugar.
É impossível sair ileso da morte.
Ficção / Literatura Estrangeira / Romance