Em As duas faces do gueto, o sociólogo Loïc Wacquant analisa o aparecimento de um novo regime de marginalidade urbana nas sociedades ocidentais. A partir da implantação da agenda neoliberal, passa-se de uma fase de investimento em políticas de bem-estar social para políticas de penalização da pobreza.
Com rico material de campo, o autor conduz o leitor ao gueto norte-americano, dissecando a estrutura do que chama de “cidade negra dentro da branca”. Não só descreve o espaço de segregação racial como também elabora um conceito relacional de gueto: “instrumento institucional composto de quatro elementos – estigma, restrição, confinamento espacial e enclausuramento organizacional”. Por um lado, o gueto perpetua a exclusão e a exploração econômica e, por outro, garante certa proteção ao permitir alternativas de organização e autonomia cultural – daí suas duas faces.
Wacquant critica o aumento generalizado das populações carcerárias, cujo controle se torna cada vez mais custoso. Diz: o sistema penal se tornou uma forma de conter as mazelas sociais que decorrem da ausência de políticas sociais. Segundo ele, as prisões “se transformaram em aterro sanitário para dejetos humanos de uma sociedade cada vez mais diretamente subjugada pelos ditames materiais do mercado e da compulsão moral da responsabilidade pessoal”.
As duas faces do gueto, primeira obra de Loïc Wacquant publicada pela Boitempo, é fundamental para aqueles que pretendem entender o que está por trás de fenômenos comuns a todas as metrópoles mundiais: segregação da pobreza, aumento da violência e incapacidade de resolver a questão com medidas puramente repressivas. Uma reflexão extremamente necessária para desenvolver o pensamento crítico em tempos de aprofundamento de desigualdades.