"(...) Desceram em silêncio as densas colinas do deserto, de olhar perdido nos confins do vale a que os trouxera a chamada de Ma el Aïnine, sheik da cidade santa de Smara. Vinham do Sul, da Mauritânia, do Sudão e mesmo da longínqua Tombuctu, fugidos do mundo de areias e de sonhos devastado pela guerra, e unidos todos na surda inquietação que aproximava guerreiros e crianças, doentes, velhos, mulheres e animais, partiram para uma derradeira e desesperada viagem a caminho do seu próprio fim.
Foi desta pobre gente, sem piedade perseguida e massacrada pelos conquistadores franceses, que descendeu a jovem Lalla, a menina da grande cidade junto ao mar, que mais tarde serviria como criada num hotel sórdido de Marselha, para tornar-se por fim uma celebrada cover-girl, descoberta por um fotógrafo de modelos.
Porém, não obstante todas as experiências que usualmente transformam os seus conterrâneos emigrantes em escravos adormecidos e submissos, nunca a abandonou o desejo de regressar ao deserto à terra estranha onde encontrara aquele que não mais deixou de a habitar como uma obsessão e um enigma".
[CRÍTICAS DE IMPRENSA]:
«Considerado como uma súmula da arte de Le Clézio, este livro acompanha, em dois registos diferentes, um histórico e outro ficcional, a vida dos nómadas dos desertos do Norte de África, os homens e mulheres que apenas conhecem o céu como tecto e as dunas como morada.» ----- José Guardado Moreira, Expresso.
[Sobre o Autor] : NOBEL DA LITERATURA 2008
Escritor e ensaísta francês, Jean-Marie Gustave Le Clézio nasceu em 1940, em Nice, sendo originário de uma família com ascendência inglesa e bretã. Viveu ainda nas Ilhas Maurícias, algo que o levou a ganhar o gosto pelas viagens e pelo conhecimento de novos mundos. Aos 23 anos, depois de se ter licenciado em Letras, em Aix-en-Provence, Le Clézio lançou o seu romance de estreia, Le Procès-Verbal, com o qual ganharia, em 1963, o Prémio Renaudot, um dos mais importantes galardões literários do seu país. Em 1980 Jean-Marie Le Clézio recebeu, em França, o prémio Paul Morand para distinguir o conjunto da sua carreira literária. Nesse ano havia lançado aquela que foi considerada a sua melhor obra, o romance Désert, a epopeia de um jovem descendente de tuaregues. Entre as suas restantes obras destacam-se Fièvre, uma coletânea de contos, e os romances Le Déluge, La Quarantaine e Poisson d'Or. A sua obra está pejada de personagens obcecadas pela morte. O escritor coloca o ser humano a enfrentar diversas experiências que lhe proporcionam viver variados tipos de aventuras interiores. Désert aborda uma das grandes preocupações de Le Clézio, as condições de vida dos povos nómadas ameaçados de extinção, assunto que desenvolveu em diversos ensaios. Entre os povos sobre os quais escreveu, e entre os quais viveu, estão os índios do Panamá e os berberes de Marrocos. Entre 1970 e 1974 viveu com os índios emberas, no Panamá, em plena floresta. Le Clézio conheceu estes índios depois de ter estado dois anos no México a prestar serviço militar, período que aproveitou para viajar e visitar as regiões vizinhas. A mulher de Le Clézio é de origem saraui e juntos lançaram em 1993 Gens des Nuages, um ensaio sobre a terra natal dela. As obras de Le Clézio já foram publicadas em alemão, castelhano, chinês, dinamarquês, grego, inglês, japonês, russo e turco, entre outras, fazendo com que seja um dos autores franceses mais traduzidos no mundo. Desde 2002 integra o júri do Prémio Renaudot. Em 2008 foi-lhe atribuído o Prémio Nobel da Literatura.
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