Entre 1892 e 1924, cerca de 16 milhões de imigrantes passaram por Ellis Island, ilhota situada a sudoeste de Manhattan, próxima da Estátua da Liberdade. O lugar ficou conhecido como “ilha das lágrimas” e durante décadas funcionou como porta de entrada para os que chegavam aos Estados Unidos, sobretudo europeus expulsos de sua terra natal pela miséria, intolerância política, racial ou religiosa. No final dos anos 1970, Georges Perec visitou a ilha com o cineasta Robert Bober, a fim de registrar os vestígios de quem por ali passara e de realizar um filme sobre o porto, material que depois foi transformado neste livro. Como descrever esse lugar? Como narrar a história de milhões de pessoas que fariam parte da formação daquele país? E como pensar na própria condição do autor como judeu e estrangeiro? São essas algumas das perguntas que atravessam Ellis Island, um dos últimos livros publicados por Perec. Com tradução a quatro mãos por Vinícius Carneiro e Mathilde Moaty, a obra divide-se em duas partes: primeiro com a descrição de dados objetivos da inspeção que ocorria no porto e depois uma digressão sobre o lugar do autor dentro desse caminho da diáspora. Como escreve Paulo Neves no texto de orelha, “Ellis Island não é um simples documento do passado. O que Perec reconhece é uma figura recorrente da história: a migração forçada dos povos (como o atesta o drama contemporâneo dos refugiados) na qual também ressoa a própria trajetória pessoal, marcada desde a infância pelo desaparecimento da mãe em Auschwitz e pelo fato de ser judeu (algo ligado ‘a um silêncio, uma interrogação’).