A presente antologia é parte integrante do Mnemósine, site dedicado à memória e visibilidade das escritoras francesas dos séculos XVII e XVIII.
Do final do reinado de Luís XIV até a Revolução Francesa houve um florescimento excepcional de contadoras de histórias, principalmente nos salões literários que se dedicavam ao conto de fadas em todas as suas formas. Foi um verdadeiro fenômeno. Mademoiselle L’héritier, na sua dedicatória de Finette, assim o constatou: “é a moda: você, leitor, os ama [os contos] e eu os escrevo com prazer”. Dentro dessa tendência iniciada em 1690 e que se desenvolveu nos salões literários franceses e na Corte, Marie-Catherine d’Aulnoy ocupa um lugar de destaque, não apenas como a precursora, mas também pela amplitude e originalidade de sua produção de contos, sendo uma das representantes privilegiadas desse gênero, praticado e dominado majoritariamente pelas escritoras da época.
Assim, nasce o conto literário feminino, uma escrita mundana e galante com tendências romanescas. De forma mais ampla, no entanto, é do encontro entre literatura oral e escrita, popular e literária, antiga e moderna que esses contos se inspiram, na sua estética, poética e rica imaginação.
Os contos de fadas de Marie-Catherine d’Aulnoy obtiveram imediato e duradouro sucesso, pois foram traduzidos para o inglês antes dos contos de Perrault, muitas vezes reimpressos no século XVIII (MORNET, 1910). Mas eles também sofreram uma desapropriação dupla: sua inclusão na literatura infantil e juvenil e a recuperação pela cultura popular. É a (re)descoberta desses contos de fadas escritos por mulheres que esta antologia pretende focalizar, por meio de traduções inéditas para o português de contos publicados durante duas décadas, no período de 1690 a 1709.
Estudar os contos permitirá, também, descobrir as plasticidades, estruturas mentais, sociais, estéticas e culturais da sociedade da época. No início do século XVIII, principalmente, o conto encontrava-se em meio a questões sociopolíticas, culturais e linguísticas importantes (JASMIN, 2009, p. 23). Nesse período, o conto caracteriza-se como uma produção abundante. O nosso recorte temporal incidirá, portanto, sobre o final do século XVII e a primeira década do século XVIII, pois trata-se do momento da emergência, formalização e cristalização do patrimônio popular oral. O conto torna-se, então, um gênero literário.
Desse modo, a presente antologia pretende divulgar essa produção literária das contistas francesas por meio da tradução comentada, resultado de uma pesquisa inédita no Brasil. Estão reunidos nomes como Catherine Bernard, Charlotte-Rose Caumont de La Force, Marie-Catherine Le Jumel de Barneville, Louise de Bossigny Auneuil, Henriette-Julie Castelnau e Catherine Durand, alguns dos quais, vale enfatizar, apresentados ao público brasileiro pela primeira vez. Que estes textos possam não apenas maravilhar leitoras e leitores do século XXI, assim como maravilharam no passado, mas também ampliar sua percepção e compreensão do gênero conto de fadas, tomando-o à luz da perspectiva feminina.
Esta Antologia apresenta dez contos inéditos de seis contistas diferentes, listados abaixo. Convidamos o leitor a descobri-los.
Fantasia / Literatura Estrangeira