A calúnia, a difamação e a maledicência floresceram como nunca na França do século XVIII. Antes da Revolução, publicações anônimas, denominadas libelos, desafiavam a censura ao combater o despotismo crescente do governo, cada vez mais distante do homem comum. Ante o risco de passarem o resto de seus dias nas celas da Bastilha, os criadores desse submundo literário se refugiaram em diferentes capitais europeias. Em Londres, estabeleceu-se uma verdadeira linha de produção incluindo escritores, livreiros e distribuidores que recorriam a caminhos tortuosos pelos quais os libelos chegavam ao continente, onde eram consumidos por um público ávido por ter acesso às intrigas e à imoralidade que reinava nos subterrâneos do poder. 'O Diabo na Água Benta', um dos libelos mais corrosivos da época, é uma narrativa irônica do labirinto em que se perderam os agentes franceses que atravessaram o Canal da Mancha e se infiltraram nos becos londrinos dispostos a desmontar a indústria editorial que ameaçava os fundamentos da monarquia. Embora tivessem sucesso em intimidar um ou outro autor ou em suprimir algumas tiragens, os policiais eram geralmente ludibriados, e muitos se venderam, passaram a fazer jogo duplo e contribuíram para a multiplicação das denúncias que, segundo Robert Darnton, tiveram um papel nada desprezível na mobilização popular que desencadeou a Revolução. A partir de um trabalho de pesquisa de erudição invejável, Darnton nos revela uma literatura pouco conhecida, de importância histórica indiscutível, precursora do jornalismo investigativo - e também do sensacionalismo - dos nossos dias.