"QUANTOS EUS CABEM DENTRO DE UM MESMO PERCURSO?
Alguém disse uma vez que um homem nunca se banha em um mesmo rio duas vezes. Por experiência própria, posso dizer que isso é um fato, não apenas pelo movimento de renovação das águas, mas pelo movimento de renovação de nosso interior. Eu tinha 30 anos e já estava na estrada há dois; tinha partido de Anchorage, no Alasca, e dentro de alguns meses chegaria a São Paulo, à minha casa. Muita coisa tinha acontecido entre minha primeira travessia pelo Atacama e a que eu empreendia naquele momento. Era outro, sem dúvida. Mas há sempre algo que se mantém. Minha fome de movimento e minha sede de descoberta continuavam as mesmas."
Os números perseguem André Fatini. Números pequenos, mas às vezes também de proporções astronômicas. Números misteriosos que serviram, às vezes conscientemente, às vezes por mero acaso, como bússola na maior viagem que ele já fez sobre duas rodas. Três anos pedalando de Anchorage, no Alasca, a São Paulo, aonde chegou justamente no dia em que completou 31 anos, num 13 de maio, o 133º dia do ano. Na jornada, percorreu cerca de 30 mil quilômetros, o mesmo número de alunos que já passaram por suas aulas de Física em um cursinho pré-vestibular na capital paulista. Sim, porque, além de transeunte, André é professor. Transita pelas salas de aula, assim como transita pelas estradas. Não deixa marcas materiais, mas planta memórias nele e nos outros. Ensina e aprende. E, por isso, este é um livro sobre essas memórias, as memórias de quem cruzou e se perdeu em desertos, fez amizades e viu o mundo de perto. Em Transeunte há um tanto da física e da história que regem o mundo e um outro tanto da magia de assistir a um pôr do sol, de escalar uma montanha, de completar uma jornada e, no fim, voltar para casa.