Dani 20/09/2023Uma personagem com potencial dimunuida por um homem problemático e abusivoLer esse livro foi como ver uma semente germinar em uma planta forte que no fim foi totalmente comida por formigas.
Jane Eyre não é um livro feminista, como vi algumas pessoas comentarem aqui. Além de ser uma análise anacrônica, Jane Eyre é uma personagem contraditória e, ouso dizer, mentalmente fraca. Ler esse livro e ver Jane se apaixonar pelo Sr. Rochester é como presenciar uma moça inteligente e com profundo potencial cair numa teia de Síndrome de Estocolmo. Eu sinceramente não consigo conceber quem leu esse livro e considera ele ROMÂNTICO e uma história de amor épica.
O Sr. Rochester é um homem que tem idade suficiente para ser o pai da Jane. É um homem que se apaixonou por uma moça jovem com pouquissíma experiência de vida, que a manipulou, que foi fisicamente e mentalmente agressivo com ela, que pretendia dizer após UM ANO de casados que já tinha uma esposa, da qual fala como de uma fera selvagem. Como não ver nele um predador? Como não sentir agonia das diversas cenas nas quais ele passa por cima das vontades da Jane - tal qual St. Jonh - tentando transformá-la em quem ela não é? Nas cenas que faz pouco caso da pequena Adéle? Na extrema agressividade que demonstra quando contrariado?
Quando Jane descobre sobre Bertha, é angustiante ler os capítulos que sucedem. Quando ela está determinada a ir embora, o que o Sr. Rochester faz com ela além de intimidação física, chegando a sacudi-la, é puro gaslighting. Em nenhum momento o Sr. Rochester faz objeções à partida da Jane pensando nela, são sempre motivos sobre ele, sobre a iminente tristeza dele, sobre como a vida dele é injusta, além das várias acusações passivo-agressivas sobre os sentimentos dela. Jane teve que deixar Thornield escondida para poder sair dessa situação, muito pela agressividade da reação do Sr. Rochester quando ela se propôs a lhe negar o casamento. E mesmo assim pessoas chamam a união desse casal, de um homem assim, de romance?
O Sr. Rochester não mudou depois do acidente que aconteceu em Thornfield. Quando descobre sobre St. John, toda a postura de gaslighting volta na maneira como trata Jane. Agora ele só não é mais tão fisicamente forte para agredi-la novamente. É absurdo e triste que a Jane do começo do livro, que enfrentava a Sra. Reed, que se indignava com as injustiças sofridas por Helen Burns, tenha se transformado nessa mulher passiva que se dobra na mão de homens abusivos, como Rochester e St. John (outro que tem na manipulação de Jane uma espécie de hobby) e ainda chama isso de amor.
Os melhores momentos desse livro são as passagens iniciais, a vida de Jane em Lowood, a breve amizade com Helen, o amor por Adéle e pela Sra. Fairfax, o vínculo forte que desenvolveu por Mary e Diana,. As experiências mais edificantes de Jane acontecem com as amigas que faz durante a história, e é sintomático que as piores passagens envolvam homens que teimam em vê-la como um pássaro a ser enjaulado na forma de casamentos.
Jane fala que não é um pássaro enjaulado, mas é exatamente o contrário o destino que a autora lhe escreveu. Prefiro a honestidade de Emily Brontë que criou Heathchilff e que não teve prentesão alguma de tornar Wuthering Heights um romance, do que o show de abuso mental que é Jane Eyre.