brun4 21/06/2024
Duas pessoas, uma só alma, e muito pouco tempo
Só Garotos, mostra a essência da escritora, cantora, artista e pessoa grandiosa que é Patti Smith. O livro traz a temática do amor em todas as suas formas, como ele nao acaba mas muda, é sobre amor, amizade, cumplicidade, é sobre o Robert e a Patti, sobre arte, sobre Nova York, e no final é só uma história, que era deles para contar e se tornou uma missão só dela.
Conhecer o Robert pelas palavras da Patti é comovente,inebriante e muitas vezes difícil, ja que minha mente tão jovem problematiza muito do que ele foi, e tenta incansavelmente entender o que eles tinham, quando ela mesmo questiona se o amor tem que ser definido; e com eles percebi que não. Muitas vezes a impressão que temos é que a Patti é completamente devota ao Robert, quando ele só é devoto dele mesmo, mas isso nao é exatamente porque o livro é uma carta de amor a ele? Afinal, ela nao so era a musa inspiradora dele, como o motivo dele continuar, fazendo arte e vivendo, infelizmente nunca teremos a versão dele da história, mas ela ja esta salva pra sempre na Patti e na arte, que nunca foi só dele.
Robert representava tudo de novo, ela se refere a ele em algum momento como a juventude em pessoa, e que mesmo nos momentos mais obscuros sua risada ainda soava como a de um menino, ele era um artista inato, aquele que tem o dom, mas tem demônios demais para realmente finalizar as obras, Robert brincava com as imagens assim como com o mundo a sua volta, que parecia sempre aberto a ele, lendo hoje em 2024, as ideias dele, não me surpreendo que muitas tenham sido bem sucedidas mesmo que ele nunca conseguisse vê-las, ele sempre foi e será único, e seu trabalho, sua arte e as pessoas que ele tocou estarão sempre presentes para que o mundo nunca perca sua juventude, ja que ele foi eternizado na sua.
Patti é alem de artista, uma pessoa completa. Ela move todos a sua volta, a sensação que tive era que seriam impossível não se apaixonar por ela, uma mulher tão a frente de seu tempo, que movia o mundo sem perceber, alguém que nao se importa com rótulos ou descrições. Como artista, queria que sua arte importasse, mas que nao fosse a coisa mais importante de sua vida, ela é livre como sempre quis ser, mesmo que hoje viva com todos os fantasmas de uma geração amaldiçoada e talvez seja a maior vitima dela, por continuar aqui, mas alguém tinha que o fazer, que contar as histórias de forma poética, artística e real, para que pudéssemos por algumas paginas sentir como era existir na difícil mas incrível vida de Patti Smith.
?Nova York foi o que me formou. Nova York foi o que me quebrou.? Nova York, o lugar dos sonhos da Patti foi o lugar que a quebrou, e a reconstruiu, onde descobriu o mundo e quebrou milhares de ideias impostas para construir as suas, pra onde fugiu para construir sua história e alcançar sua liberdade. Agora Patti se mistura pra mim com Nova York, mas honrando todas suas referências a Alice no pais das maravilhas, a Nova York da Patti é um lugar místico, como um reino encantado, em que o Chelsea Hotel é o castelo, onde você esbarra com o John Lennon no café de um hotel e é confortada pelo Jimmi Hendrix, em um momento frustrado na escada de uma festa.
?Alguém que nunca tinha sido um estranho?, fiquei completamente alucinada com a ideia fantasiosa mas nesse caso real de como a Patti e o Robert e toda sua história era destinada, se algo me faz acreditar em almas gêmeas são eles, ambos nascidos em uma segunda feira do mesmo ano, se encontram por acaso e desde então vivem entrelaçados um no outros em todas as formas de relacionamento possível que no final se torna um aspecto tão banal do que eram eles, os tratos são cumpridos os dois sucedem na arte, ela se muda e vive a vida que nunca sonhou mas que merecia, casou, amou, se tornou mãe, e descobriu no mesmo mês da sua segunda gravidez a doença de Robert, ela carregava a vida e ele a morte, mas mesmo assim nunca se livrariam da constelação que os uniu.
Acredito que Robert levou uma parte da Patti, e que ela vive desesperadamente pelos dois, porque a alma dele vive nela, antes, durante e após sua passagem no mundo dos vivos, e espero que daqui a muitos anos, quando ela tiver cumprido sua missão e vivido tudo que o mundo oferece por ambos, eles se reencontrarão, e assim como ela sentiu todos nos sentiremos que o mundo perdeu sua alma artística e gêmea.
A madrinha do Punk narra sua vida por meio de sua escrita envolvente, poética, triste, carinhosa, honesta e esperançosa, é um livro difícil de categorizar, mas tudo bem. Pra mulher que jamais se encaixou em casa alguma, deixar o livro existir por si so é o jeito mais justo de honrá-lo.
Esse livro é um presente, portanto esse texto é minha carta de agradecimento a Patti por ser quem é, sem medo de existir, obrigada pela obra de arte que você produziu sobre um momento na vida em que você não era mãe, ou um ícone, você era só uma garota, e isso sempre bastou.