Caroline Gurgel 01/09/2014É errado amar, mesmo que seja errado?
Antes de ler esse livro eu só sabia que
Lolita era uma polêmica história de um homem de meia idade que se apaixonava por uma adolescente - ou melhor, por uma ninfeta - e nada mais. Temi iniciá-lo pois as palavras amor e pedofilia na mesma frase já me dava náuseas. No entanto, em um daqueles momentos que todo leitor ávido tem de procurar diversas listas de "melhores livros do século" ou "1001 livros para se ler antes de morrer", notei que
Lolita aparecia em todas. Em todas! E, claro, pensei, por que não?
Devo, antes, dizer que li umas 80 páginas e parei a leitura, interrompendo-a por um ou dois meses. Digo isso para encorajar os que fizeram o mesmo, ainda que sem motivo, como eu. Sugiro, ainda, que não retomem de onde pararam, mas que a reiniciem com novo frescor. Valeu cada palavra.
Humbert Humbert é um professor de literatura perto dos seus quarenta anos que se muda para a pequena Ramsdale para escrever um livro. Aluga um quarto na casa de
Charlotte Haze, mãe de
Dolores - Dolly, Lola, Lo, Lolita - a ninfeta de 12 anos por quem Humbert se apaixona perdidamente. Per.di.da.men.te!
Tinha sido amor à primeira vista, à última vista, às vistas de todo o sempre.
O primeiro amor de
Humbert foi uma garota de 12 anos,
Annabel, quando ele ainda era adolescente. Ela morreu quatro meses após o início da tórrida paixão juvenil, e por isso ele tenta nos convencer de que sua obsessão por ninfetas é, de certa forma, uma busca pela Annabel perdida. Humbert casa-se com
Valeria, em uma tentativa frustrada de acabar com sua obsessão por ninfetas, mas Valeria também morre! E é após esses acontecimentos que nosso narrador muda-se para Ramsdale.
A narrativa é em primeira pessoa pelo que é chamado de
narrador não confiável, uma vez que Humbert conta-nos o que lhe convém, muitas vezes (ou sempre) tentando convencer-nos de suas boas intenções.
O que você deve saber - que eu não sabia - é que o narrador vai lhe manipular e, por vezes (por muitas vezes!), vai lhe fazer acreditar em cada linha que ele escreve. Julguem-me: eu não vejo o Humbert Humbert como um pedófilo pervertido, vejo-o como um homem que enlouqueceu de amor. Percebe como esse livro pregou uma peça em mim?
Não há como negar que o que Humbert sente por Lolita é amor. Um amor ilícito, mas amor; doentio, obsessivo, ainda assim, amor; possessivo, egoísta, mas amor. Apaixona-se por ela desde a primeira vez que a vê e pretende manter esse amor para si. Bem, assim ele o diz. Convence-nos de que Lolita sempre lhe provocou, que a atração era mútua e de que foi ela quem tomou todas as iniciativas.
"Senhoras e senhores do júri, não fui seu primeiro amante."
É uma leitura perturbadora, mas não me foi nauseante. A escrita é tão incrível que burlou meus pensamentos e me deixou boquiaberta aplaudindo de pé. A adjetivação contida nessas páginas é de fazer qualquer um babar, é inacreditável a capacidade de Nabokov com as palavras. Quantas vezes ele descreveu Lolita? Inúmeras! E todas únicas e fantásticas. A narrativa é rica, poética, meio hipnotizante, de uma estética encantadora.
Apesar de tudo, os personagens são extremamente irritantes, mesmo a "doce" Lolita, o que não deu brechas para que eu tivesse piedade dela. Mesmo diante dos favores sexuais exigidos pelo Humbert Humbert em troca de algumas moedas ou concessões, não consegui convencer-me completamente de sua inocência. Lembrem-se, foi o Sr. Humbert quem me contou a história!
É engraçado que há uma outra figura,
Clare Quilty, e este sim é um pedófilo pervertido que dá nojo. Mais uma jogada de Nabokov?
Ao término da leitura, certa ou errada, convenci-me de que Lolita não era realmente ingênua, que não foi estuprada pelo HH e que no início correspondia aos seus flertes. Não sei dizer se ela um dia o amou - ou se algum dia foi capaz de amar alguém, tendo sido tão precocemente iniciada na vida sexual. Porém, torci para ela que fosse feliz e senti pena das lágrimas do amor incondicional, maluco e intenso do obcecado Humbert.
Para quem tem medo da leitura, aviso: as cenas não são gráficas, mas é inevitável que elas se formem na sua cabeça. No entanto, a elegância da prosa é tamanha que você vai lendo e lendo... Acima de tudo, Lolita é uma
obra prima da literatura e merece ser lida, degustada e apreciada. Adorei fazê-lo e recomendo de olhos fechados - mas, lembrem-se, mantenham a cabeça bem aberta!
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