Lorran 15/09/2010As Garotas da FábricaA República Popular da China é o terceiro maior país do mundo em área; tem 1,3 bilhão de habitantes (20% da população mundial); e se tornou uma das economias que mais cresce no mundo, estando entre as dez maiores. O país tem taxas de crescimento de cerca de 9% ao ano e se tornou um gigante do comércio, conquistando o quinto lugar em exportações.*
Com números tão expressivos e com os holofotes voltados para o país, era de se esperar que começássemos a criar certa curiosidade em relação ao gigante asiático. Pelo menos comigo foi assim, e posso dizer que tive duas experiências literárias fantásticas em relação à China. A primeira foi com o livro Adeus, China, do bailarino chinês Li Cunxin, e a segunda com As Garotas da Fábrica, da jornalista norte-americana Leslie T. Chang.
Impossível não correlacionar esses dois livros, são complementares. É extremamente interessante notar as diferenças do olhar chinês e do olhar americano. Mas deixemos o primeiro para um próximo momento. Na resenha de hoje falarei d'As Garotas da Fábrica, já que quero reler Adeus, China antes de resenhá-lo. (como ganhei de presente de aniversário da Nathália, ela sai logo, logo)
Comecemos pela autora: Leslie T. Chang é uma jornalista estadunidense filha de imigrantes chineses. Apesar de falar mandarim desde cedo, Leslie sempre resistiu às influências chinesas, procurando desvencilhar-se de suas origens. Mas a partir do momento em que o país começou a atrair a atenção mundial, o conhecimento da língua fez dela a correspondente ideal. Por meio de reportagens especiais para o Wall Street Journal, Leslie desenvolveu textos que se tornariam o fio condutor de As Garotas da Fábrica.
"A história de uma família começa quando alguém sai de casa." - Leslie T. Chang
A frase acima é o mote do livro. Leslie remonta as milenares tradições chinesas para mostrar que o fluxo migratório é uma constante chinesa. Faz parte da história da própria família da autora. É claro que esse é um novo modelo de migração, que faz parte de uma transformação recente do país, mas que é intrínseca à tradição chinesa - e que é explicada através da exploração das raízes da própria autora.
Mas o grande barato do livro é poder conhecer melhor essas tão faladas fábricas chinesas. Afinal, que não tem uma infinidade de produtos Made in China no armário? Fica fácil saber porque as grandes empresas transferiram suas confecções para lá. Em uma parte do livro, Leslie conversa com o chefe de operações de uma fábrica que, entre outros, produz os tênis da Adidas. Questionado sobre condições de trabalho e baixos salários, ele diz: "desde que entregássemos os produtos aos clientes a certo preço, eles não queriam saber como administramos as fábricas." Apertados pela opinião pública, as grandes empresas fazem exigências de mudanças às fábricas chinesas, mas ao mesmo tempo exigem preços mais baixos.
É claro que as péssimas condições de trabalho e os baixos salários não são novidade. Qualquer empresa que se preze busca sempre a mão de obra mais barata. Em que condições ninguém quer saber, contanto que estejam lucrando com isso. Mas não é só disso que vive o livro. Da dinastia Ming às fábricas, passando por Mao Tsé-Tung e a Revolução Cultural, Leslie explora o desenvolvimento, as mazelas e as contradições do povo chinês. É uma viagem inesquecível não só pela China atual, como um regresso às intrincadas tradições chinesas.
Ah, o livro não se chama As Garotas da Fábrica à toa, afinal elas são maioria nas fábricas. Mas não vou contar porquê. Senão conto o livro todo. :P