spoiler visualizarMelga Marçal 14/08/2023
Um "incel", um "gigachad" e uma "fêmea", mas é 1771
Mais um clássico pra lista. Achei bem massa, com alguns pontos que não me deixam dar 5 estrelas.
Teve muitos momentos que me identifiquei demais com o Werther, principalmente as questões de não se encaixar com um grupo social e o desentendimento com a família. Mas minha nossa como ele consegue ser INSUPORTÁVEL. Acho que essa era a intenção do autor também (tá no nome do livro afinal de contas) que esse jovem é muito queixoso e, nas palavras dele mesmo, sentimental demais. Tive momentos de raiva também pensando "miga sai daí e muda de vida!", mas entendi também o que levou os personagens a fazerem o que fizeram.
Esse livro me levou a pesquisar mais sobre literatura e descobri o nome do subgênero de ficção que eu AMO "romance epistolar", ou seja, histórias que são contadas através de cartas, folhetins, jornais, documentos, diários etc. Isso dá aquela sensação de realidade e de que a história realmente aconteceu. Claro, tudo depende de suspensão de descrença e interpretação dos leitores, mas autores que sabem escrever nesse gênero não tem problema em te convencer da "realidade" da história. Por exemplo, os diálogos são ditos por Werther como verídicos, mas é improvável que alguém se lembre de tantos detalhes de uma conversa.
Goethe pra solucionar isso faz com que os personagens relembrem o leitor de que tudo é filtrado pela experiência de Werther e que a visão super-romântica não deixa ele ver situações de maneira objetiva. O autor também menciona lugares e descreve situações que parecem reais, mas sempre passando por como Werther enxerga tudo. Isso tudo dá a sensação de que tu tá ouvindo os desabafos de alguém (que realmente é, pois Werther está escrevendo as cartas para seu amigo).
O que não me deixa dar 5 estrelas é só a frustação do final e construção do romance. Faz todo sentido porque o final aconteceu. É uma história trágica de jovens apaixonados, amor proibido, ela já é prometida pra outro, blá, blá, blá. Mas mesmo entendendo o contexto histórico, os valores da época e tals, não consigo não me sentir desconfortável pelo jeito que Lotte é desumanizada aos olhos do personagem principal e como a "única" coisa deixando ele vivo seria a reciprocidade do amor dela.
Se fosse nos dias atuais, Werther com certeza seria um incel do reddit que pirou depois da vizinha que ele ficou obcecado e stalkeou, começou a namorar um chadzão. Ele ia reclamar muito nos fóruns sobre como as "fêmeas" de hoje em dia não sabem apreciar as coisas boas da vida e só se importam com conforto que um "homem de verdade" consegue prover, mas como ele não é assim e nunca será. Ele é sentimental, ele lê poesia, ele se importa demais com ela, ele sabe cuidar, amar , recitar Homero etc. etc.
O foda é que em nenhum momento Werther nos dá motivo pra odiar ou ao menos pensar em porque Lotte devia largar Albert. Este é educado, mais rico, bonito, elegante, claramente ama Lotte a até FAZ AMIZADE COM O CARA OBCECADO COM A NOIVA DELE.
O que me leva ao meu último ponto que deixaria o romance incrível e nos daria um final feliz (mas óbvio que nunca iria ter sido escrito e publicado no século 18): Um trisal.
Deve ser pelo meu viés queer e de pessoa do século XXI, mas o jeito que Werther descreve Albert é quase igual ao jeito que descreve Charlotte. Eles nunca tem um confronto final e Albert até tenta convencer ele a não seguir com o plano de se matar. Acho que minha solução seria os três de unirem e formarem um relacionamento que quebra tradições, vivendo felizes pra sempre no interior.
Em geral o livro é muito massa é um clássico por motivos óbvios. Desafiou várias tradições literárias naquele tempo por ter um protagonista que se mata no final, por ser bucólico, romântico e talvez até chocante para o público da época. Mas é difícil ler algo do passado sem deixar os vieses do presente destoem um pouco a compreensão da história.
4/5 estrelas podia ter mais viad4g3m kkkk
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