carolinadevermelho 25/02/2021
E Mary Shelley só tinha 19 anos!!!!
Eu não sou acostumada a ler nada que possa me causar qualquer sensação de medo. Eu não leio terror. Eu acreditava que Frankenstein se tratasse de um terror que me atemorizaria de todas as formas. Nunca assisti nenhuma adaptação a o cinema. Nunca vi ou li nenhuma resenha sobre o livro. De certa forma, eu tinha medo.
Mas, o que me aconteceu foi que, um dia eu assisti ao filme sobre a Mary Shelley, tempos depois ouvi uma booktuber que gosto muito falando sobre ela. E uma série de acontecimentos ao longo de janeiro e fevereiro deste anos me fez, antes mesmo de me apaixonar por sua obra-prima, me em encontrar totalmente fascinada pela sua biografia. Que talento, que dom. Não apenas como romancista, também como ensaísta, como dramaturga, no seu processo de descrição sobre suas viagens, qualquer coisa que ela se propusesse a escrever sairia ótima, era a sua habilidade com a escrita uma das mais extraordinárias já vistas.
Ela só tinha dezenove anos quando escreveu Frankenstein. Dezenove anos. Filha de um anarquista com uma precursora do feminismo, seus pais tinham o dom que foi a ela transmitido, ambos amavam escrever. Viveu fora dos moldes que a sociedade do início do século XIX tinha como imposição para as mulheres. Ela estudou muito e conseguia manter qualquer conversa sobre os assuntos dos mais cotidianos aos mais científicos, o que não era esperado de uma mulher naquele tempo.
E é por isso que passa a ser ainda mais fascinante ler Frankenstein, conhecendo um pouco da trajetória de Mary Shelley. Foi inovador escrever pra que o leitor tivesse acesso à tão profunda sensibilidade dos sentimentos de uma criatura rejeitada. Não é por acaso a figura do criador, um homem da ciência, almejando grandes feitos como um exemplo de homem romântico que era, será reduzido a pó.
Frankenstein almejava tamanha grandiosidade, me parece que desejava ter acesso ao que teve prometeu na sua decisão de roubar o fogo dos deuses e a fagulha dívida, conduzindo-os à humanidade. Também não à toa, outro título para esse livro é ?O Prometeu Moderno?. Porém no alto de sua ambição, Frankenstein, também teve seu fígado devorado dia após dia pela águia de dor e desespero da vingança e do ódio de sua criatura.
Achar culpados entre criador e criatura, na minha opinião, seria perda de tempo. Houve a decisão inicial de Victor, se ela for considerada um erro, dessa primeira decisão uma sucessão de erros foram acontecendo em cadeia.
Gerando os maiores sofrimentos possíveis ao criador, que se encheu de horror ao contemplar a sua criatura, não sendo capaz de acolhe-la no mundo para o qual a trouxe, posteriormente a criatura não conseguiu ser perseverante em suas virtudes já que constantemente era reforçada de forma contrária (que criatura, humana ou não, que fosse sensível aos afetos, sobreviveria à rejeição extrema?), seus sentimentos puros foram substituídos por ódio e vingança, Victor Frankenstein não conseguiu repetir a decisão que deu início às sucessões de tragédias e foi então que criatura e criador partiram a procura de se destruírem.
A criatura destruir o criador era, de certo modo, também significava destruir ela mesma, como parte do criador. Assim como o criador perseguir a criatura era como perseguir a si mesmo, à culpa e o remorso que sentia pelos seus próprios erros.
Criador e criatura erraram sucessivas vezes, ambos também possuíam bondade e virtude, ambos sofreram terrivelmente, cada um, os seus infortúnios. Não existe entre esses dois personagens alguém ?totalmente bom? ou ?totalmente mau?, existem seres que tomaram decisões erradas mais como se sob a influência de um destino inexorável, do que por qualquer outra razão.
Para mim, é totalmente extraordinária a sensibilidade de Mary Shelley aos dezenove, e totalmente compreensível que tenha tanta experiência para escrever a respeito do sofrimento, visto que, ela sofreu dores inimagináveis ao longo de sua vida.
Fazia tempo que eu não lia um livro que, se pudesse, daria mais do que cinco estrelas. Não senti medo na leitura, não fiquei aterrorizada, mas sim, me senti muitíssimo sensibilizada. Me vi também, profundamente arrebatada, de uma forma única, um prazer que a literatura nos proporciona de maneira majestosa.