Douglas | @estacaoimaginaria 14/09/2021
Um thriller que também consegue emocionar
Li “As vantagens de ser invisível” alguns anos atrás. Não me recordo muito bem da narrativa dele, mas o que lembro é de ser algo fluído, com muitos diálogos. Em “Amigo Imaginário”, que tem uma premissa totalmente distinta do primeiro livro dele, as coisas são mais diferentes, com uma leitura mais densa, mas com bons diálogos que ajudam no desenvolvimento da leitura.
No início, é meio que uma apresentação dos personagens, das razões de Kate estar fugindo, da relação dela com o filho, e suas dificuldades na escola. Então, conforme ele vai construindo sua narrativa para chegar ao mote do livro, o autor usa outras tramas, como a escola de Christopher, bullying, os problemas financeiros da mãe dele etc. A partir daí ele vai criando uma atmosfera de que está tudo bem. Como se fosse o fim do livro. Mas não chegamos nem na metade…
A questão é que tem uma expectativa no ar, que o autor consegue deixar ao conduzir a narrativa. Uma expectativa de que algo vai acontecer, cedo ou tarde… algo ruim, obviamente. Mas o autor escreve a história de uma maneira a não te deixar largar o livro enquanto não descobrir o que está acontecendo. A cada capítulo, é uma pista nova, que torna tudo mais confuso, mas que ao final esperamos que faça sentido. Tem os padrões, as coincidências… e a leitura vai avançando, te deixando curioso a cada página pra saber tudo, ter todas as respostas. Se é que elas existem.
As sequências de quando Christopher está nos bosque, principalmente a primeira vez, toda a tensão, o suspense, aquilo que não podemos ver, nem mesmo Christopher, mas ouvir muito bem, é incrível. Acho que o livro consegue fluir muito bem nessas partes, pois o autor parece colocar toda sua energia e criatividade nesses momentos, entre outros. A primeira vez que Chris está no bosque é, para mim, um dos pontos altos da primeira parte do livro. Porque o autor cria uma atmosfera incrível em volta disso que nos deixa ansiosos a cada linha.
Por isso, ao final, a minha avaliação é que os momentos dentro desse bosque são as melhores partes do livro, tão bem escritos quanto tensos. Até por toda ambientação feita pelo autor. Mas há também um histórico de que essas florestas à noite são cheias de monstro e tal. Mas ele não se limita a isso, ele consegue fazer com que o suspense e essa atmosfera de suspense ultrapasse os limites do bosque e chegue às casas das pessoas, ao nosso imaginário. Enquanto isso, ficamos com o coração agitado, sem saber o que vai acontecer na página seguinte.
O autor, ao longo da história, nos apresenta diversos personagens, com histórias diferentes, traumas, problemas, virtudes. Ele disseca o psicológico delas, nos dando uma visão ampla sobre a essência do ser humano nas variadas situações do dia a dia. Eu até poderia considerar isso uma trama paralela por parte do autor. Porque, na verdade, essas questões envolvendo cada personagem têm relação com toda a história do livro. Isso, ao longo da narrativa, influencia nas atitudes de cada, na vida de Christopher e na sua missão.
Certamente eu poderia destacar as personagens de Kate e Christopher, os principais, mas também Jerry, o ex-namorado de Kate, de quem ela foge no começo do livro, os amigos de Christopher, que fogem do padrão do contexto da história, assim como o próprio Christopher. Enfim, são personagens ricos, que nos presenteiam com bons diálogos, influenciam na história e fazem ela se desenvolver. Kate, principalmente, demonstra uma garra e uma força que só uma mãe poderia ter. E isso é o mais incrível.
Ao longo da narrativa, para mim, a história se tornou algo como o bem contra o mal, Deus contra o diabo. Tem até uma áurea meio apocalíptica. O que, claro, é interessante e volta a dar força para a história. Porque confesso, depois da metade, comecei a perder um pouco o interesse. Mas o autor conseguiu me prender novamente. E isso não é fácil, porque estamos falando de um livro de 770 páginas. Então, é até compreensível que o autor perca um pouco do fôlego do início. No entanto, isso é superado, quando as coisas começam a chegar no clímax.
O livro vai do terror ao amor, do assombroso à emoção. E isso acontece de uma forma bonita. Nos mostrando o amor de uma mãe por um filho, de um filho por uma mãe. Tudo o que é sacrificado nesta relação. De fato, é muito bonito, inspirador e emocionante. Mas o autor não deixa o terror de lado. Ele consegue demonstrar tudo isso de uma forma a ainda nos deixar ansiosos para ver o que vai acontecer, de sabermos que os problemas não acabam até a última página – e olhe lá!
Na segunda parte, como disse antes, as coisas esfriam um pouco. Como se o autor fizesse uma pausa naquele suspense e colocasse outros elementos. Mas ele explora de maneira sutil as mudanças de Chris depois de ficar desaparecido. É como se quisesse mostrar como as coisas vão acontecendo devagar. Nessa parte, ele nos deixa intrigado para entender essas mudanças de comportamento, enquanto vai preparando o terreno para o que está para acontecer logo depois.
Então, ainda nesse sentido, lá pela página 200, parece que as coisas estão perto do fim, mas não é bem assim. Ainda temos um longo caminho pela frente. E a leitura chega a ficar um tanto arrastada nesse momento. Mas o autor tem alguns “truques na manga”, com ocasiões em que consegue nos deixar novamente interessados, como o capítulo 39. É de dar medo e te deixar ansioso pra saber o que vai acontecer. O capítulo 40 é mais surpreendente ainda. Para mim, é como se estivéssemos assistindo a um filme de terror com uma cena de ação.
Citei na metade dessa resenha a questão da influência que o autor usa dessa atmosfera que florestas e bosques criam em histórias de terror. E isso é muito bem utilizado por ele. No entanto, há uma outra referência que ele usa: Stephen King. Isso é perceptível ao longo da narrativa. Não a ponto de falar “será que estou lendo um livro de King ou de Chbosky?”. Mas há essa influência, até na “enrolação”, no bom sentido, com muitos devaneios, que fazem sentido para a história e complementam o livro. Só que não deixa de ser algo que foge da objetividade.
Outro ponto que eu gostaria de destacar são as reviravoltas. Óbvio que não darei spoilers, mas o autor consegue te surpreender de uma maneira a te deixar de boca aberta. E isso é muito bom. É aí que vive a fantasia, o suspense, o thriller, na minha visão. Quando pensamos que sabemos pelo menos metade das respostas, o autor vem e nos mostra como estávamos errados – às vezes muito, às vezes só em algumas coisas. Mas é isso que dá o gás para finalizarmos a obra com chave de ouro.
E aí chegamos ao fim. Se me permitem um pequeno spoiler: é um final esperançoso, ao mesmo tempo que assombroso. É só isso o que vou dizer. Tipo, é como se ele colocasse uma deixa para uma possível sequência, ao mesmo tempo que nos deixa com a sensação de que acabou. O resto é para nossa imaginação. Mas o fim representa muita esperança também, principalmente em relação a essa coisa do bem contra o mal, do amor de uma mãe/pai com o filho e vice-versa. Como as amizades são importantes em momentos decisivos.
Enfim, ao acabar o livro, me senti como se tivesse acabado de assistir a uma série de dezenas de temporadas, mas que passaram num piscar de olhos. Sim, é uma leitura instigante, curiosa, de te dar arrepios, te deixar ansioso e com o coração palpitante. Mas também de te deixar com lágrimas nos olhos. Para mim, quando um livro de suspense como tal consegue te emocionar, é o mesmo que juntar todas as peças de um quebra-cabeça. Isso é necessário para completar a obra, ainda mais uma tão tensa e significativa como essa, que vai muito além de um simples romance.
Recomendo muito a leitura, o livro tem mensagens importantes, mas o mais importante é que ele consegue te entreter e te envolver de uma maneira singular. Não que eu tenha terminado a leitura ouvindo vozes na minha cabeça, mas é quase isso haha enfim!
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