Luiz Pereira Júnior 23/04/2022
Amor, esnobismo e otras cositas más...
Primeiro, a parte pessoal: sempre fui um amante de livros, mas minha família jamais teve dinheiro para comprá-los. Decidi fazer Letras principalmente por esse amor aos livros e sinto-me profundamente realizado em ser professor de Literatura. Lembro-me de não poder comprar os livros que os professores universitários recomendavam (e havia aqueles professores que recomendavam apenas um ou outro capítulo de determinado livro ou determinadas páginas). Como iria comprar um livro de quase 200 reais (a preço de hoje) se meus pais viviam com uma renda de um pouco mais de um salário mínimo? Então, tome fotocópias a torto e a direito (é claro que todas elas se perderam com o desgaste natural, afinal não eram encadernadas e serviriam apenas para aqueles poucos meses de aula).
E quanto aos livros para entretenimento, para fruição? Lembro-me de passear pela Livro 7, em Recife, que diziam ser a maior (e acho que era mesmo) livraria do mundo sob algum critério de que não me recordo, mas quase sempre voltava para casa com um livro que se adequasse ao dinheiro que eu tinha no bolso e não aquele que eu queria ler de verdade. Isso foi ruim? Nem tanto, pois acabei descobrindo algumas joias brutas que estavam no encalhe, vendidos a 10 ou 15 reais a preços de hoje...
Lembro-me também de que, certa vez, entrei em uma livraria e saí depois de poucos minutos, pois os livros eram tão caros, as pessoas eram tão esnobes, os atendentes eram tão infames que eu me senti um coitado que imploraria para algum dos clientes comprar um livro para mim...
Então, comecei a frequentar sebos, mas descobri que também lá não era o paraíso que muitos dizem ser: preços que variavam de uma semana para outra, livros por vezes mais caros que nas próprias livrarias e o mesmo livro tinha preços diferentes de acordo com a cara ou com a aparência do freguês (fiz essa experiência com alguns colegas na época)...
Comecei a trabalhar e a comprar os livros que não pude ter. Apaixonei-me e continuo apaixonado até hoje pelo Círculo do Livro (mas essas é outra história) e me mudei para uma cidade sem livrarias. Fazia a lista dos livros que queria e, ao voltar a Recife, comprava-os na Livraria Cultura de algum shopping (sempre caros). A internet surgiu e passei a comprar no site da Livraria Cultura (continuavam caros, mas, pelo menos, havia uma espécie de programas de milhagem por assim dizer). Descobri primeiro o Livronauta e depois a Estante Virtual, em que continuo a comprar.
Então, surgiu a Amazon e, sinceramente, dei graças a Deus (explicarei o porquê no final da resenha).
E em relação a “Contra Amazon”? Um livro que fala sobre livros: será que existe algo melhor para os apaixonados por livros? Jorge Carrión nos traz 19 ensaios sobre o mundo das letras e a edição brasileira ainda acrescentou mais nove de pessoas que trabalham diretamente com esse fetiche chamado livro.
E, como toda coletânea de ensaios, essa também não foge à regra: é bastante irregular. Mas isso também não foge à regra, pois o que pode ser um bom ensaio para mim, para você poderá ser algo trivial, para outro leitor será uma imensa tolice e para outro será um momento de iluminação divina. Dito isso, escrevo restritamente sobre minha opinião (e, digam o que disserem, usem as belas palavras que usarem, uma crítica, uma resenha acaba não passando muito disso: é uma opinião). Sim, eu sei que a maioria dos ensaios parece ser tramado por ideias repetitivas, rancorosas, por vezes beirando o irreal, mas também todas com um fundo de verdade.
Não digo o pior ensaio, mas simplesmente o que menos gostei foi “Os cachorros de Capri” (não me identifiquei com o autor e sua viagem à ilha pareceu-me algo que qualquer voyeur amante dos livros teria feito). O contrário disso ocorre, quando ele desvenda em poucos dias o original mundo de Seul, quando conversa com Luigi Amara, quando retrata o mundo novo feito pelos imigrantes amantes de livros em Miami... Enfim, um livro para quem ama livros (e quem de nós não?).
Para mim, parece-me fácil dizer que apoia a cultura, que se insere na comunidade, que faz projetos culturais maravilhosos e inclusivos, que trabalha com obras selecionadas, que oferece um sistema de vendas humano (com vendedores que sabem tudo o que há nas prateleiras), com experiências gastronômicas e em outras áreas (sim, há tudo isso dito no livro). Mas e para o leitor comum? E para mim à época em que amava ler mas não podia (hoje posso, mas quantos milhares de jovens não estão na mesma situação?). O que me parece é que todos os livreiros convidados a darem seu testemunho eram os donos daquela livraria em que eu me senti tão mal...
E como justificar um livro que custa 45 reais na Amazon, 35 no sebo (mas com frete de 25 reais) e, pior, 78 reais em um certo suplemento literário de um jornal famoso? (Sim, estou consciente dos impostos, do frete, dos custos gerais, mas isso não muda a realidade para quem precisa de um livro por exigência de um professor ou para quem quer se perder durante horas na imaginação de seu autor favorito.)
Encerro com uma frase dita por um dos livreiros convidados: “Nossos clientes não nos procuram pelo preço”. Sorte sua... Ou melhor, sorte dos seus clientes que podem pagar o preço que você estipular...